quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Roku Juu... Otousan... Ni-jū Rasen!


Este é o post 60 do N.I.N.J.A. Samurai. É uma entrada que desejo dedicar a alguém muito importante na minha vida, o meu pai. É que foi neste terrível ano de 2012, temido pelos supersticiosos como o ano do fim do mundo, que tanto este blog viu o seu sexagésimo post surgir como o meu pai viu o seu sexagésimo aniversário.
Antes de mais, eis as variadas maneiras de dizer “pai” em Japonês:
Meu pai - Chichi ( pronúncia - Titi )
Pai (dos outros) - Otousan ( Pronúncia - Otôssan, e menos formal, se pronuncia sem o "o", ficando Tôssan -Tousan ) お父さん ( Na escrita, o menos formal é só tirar o "" )
O meu Pai, entre outras coisas, foi das pessoas que mais estimulou o meu gosto pela escrita, sem nunca me obrigar a nada. Quando eu era pequeno e antes de saber ler, o meu pai lia-me bandas desenhadas da Disney, do Lucky Luke, do Astérix, do Michel Vailant, etc… Quando aprendi a ler, passámos para as BD de sci fi, Marvel e DC, essencialmente. Sim, mesmo depois de eu saber ler, eu forçava o meu pai a ler-me as BD’s, porque a verdade é que ele acrescentava um ponto seu ao conto e tornava tudo mais interessante e divertido. Além disso, era tempo que passava com ele. Entre a Primária e o 10º ano, fora das obrigatoriedades estudantis, só lia BD's. Os meus pais lá me sugeriam outros livros, que eu na altura tinha como mais massudos, mas nunca me obrigaram a pegar neles. A certa altura, contudo, quando andávamos em arrumações lá por casa, descobri um livro que li numa tarde. Um livro de bolso do meu pai, de ficção científica, chamado Deuses Siderais. Ele cruzava a Atlântida, com deuses que eram de facto apenas humanóides vindos doutros planetas e cuja tecnologia perante os homens da Idade da Pedra parecia magia. It blew my mind! Anos mais tarde, andava eu no 11º, quando já tinha começado a atacar a colecção de Sci Fi (sem imagens ahahah) do meu pai. As colecções Argonauta e as publicações Europa-América, com autores como Isaac Asimov, Ray Bradbury, Robert Block, A. E. Van Vogt, entre outros, fizeram-me as delícias e abriram-me os horizontes como só a ficção científica pode fazer. Depois, via Tolkien, migrei para a Alta Fantasia, depois para os policiais e também para os romances históricos (como os de Humberto Eco). Hoje ando a ler Eça de Queirós e José Saramago, sendo que vou lendo também as aventuras de Tomás Noronha, por José Rodrigues dos Santos. Sou também grande fã de George R.R. Martin e da sua Canção de Fogo e Gelo, mas também das Crónicas de Alarya de Filipe Faria. E sim, ainda leio BD’s, quando tenho dinheiro para as comprar, pois hoje em dia já não se encontram em quiosques como no “tempo das vacas gordas” em que eu cresci, em absoluta felicidade.
Por todos os passeios à beira mar a filosofar interminavelmente, por todas as histórias lidas, por seres o meu primeiro mestre de artes marciais, por todas as aulas de astronomia em noites lusitanas, fico eternamente em tua dívida, meu pai. Que juntos festejemos saudáveis e felizes, pelo menos, mais 60 aniversários teus!
O meu pai gostava de ter sido arquitecto, mas foi sonho que ainda está por realizar. Pode ser que um dia eu lho possa proporcionar, como ele me proporciona a mim (juntamente com a minha mãe e o meu avô, claro) a minha contínua educação. Até lá, deixo estas imagens a acompanhar as minhas palavras nostálgicas e profundamente sentidas.




Legenda das Fotos: Esta é a Casa de Dupla Hélice, em Tóquio. Criada pelos estúdios de arquitectos Maki Onishi e Yuki Hyakuda . É uma casa citadina de multi-níveis, situada na zona residencial de Tóquio. Como a área onde foi erguida é cercada por outras habitações, o projecto foi limitado pelo espaço disponível, consideração que levou a construir-se em altura. Com escadas em redor do exterior e do interior, a casa torna-se numa hélice dupla, ascendendo em torno do perímetro. O núcleo é composto por um cubo branco abstracto que hospeda os espaços privados, enquanto divisões em torno do exterior suportam as áreas comuns.
Para evidenciar o traço do edifício, um painel de madeira escuro envolve a fachada. As formas simples e contrastes entre os materiais continuam no interior, onde a construção em betão é deixada exposta.
Fonte: http://www.designboom.com/weblog/cat/9/view/19372/onishimaki-hyakudayuki-architects-double-helix-house-tokyo.html










NOTA: As fotos são de Kai Nakamura.


Não sei se repararam, mas esta casa singular não foi escolhida ao acaso para este post. Afinal, que vos lembra uma Hélice Dupla (em Japonês, segundo o tradutor do google, Ni Jū Rasen == 二重らせん)?? Uma cadeia de ADN, talvez? E de onde vêm o ADN dos animais? Dos seus pais. Agora isto sim, é Desenho Inteligente! Ahaha Não resisti! ;P
Já agora, o título é apenas uma amálgama de palavras em Japonês que não fazem necessariamente sentido literário. Traduzindo à letra e por ordem (da esquerda para a direita): 60 Pai Dupla Hélice! Digam lá que não é um título pomposo quando dito em Japonês!? :D
Quanto à escultura, encontrei a imagem no google e não sei quem a fez ou fotografou, mas infelizmente não fui eu! 

Alex, signing off… again!

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Uchinaguchi e Mirandês, em "O Argumento dos Números"

No passado dia 30 de Junho, em Londres, foi celebrado o Dia de Okinawa. É verdade, a terra ancestral do Mr Miyagi, personagem de uma série de filmes muito determinante na minha infância e formação enquanto pessoa. Para o Mr Miyagi, a guerra é uma estupidez pura e simplesmente, o Karate serve apenas para defesa, mas, se nos forçam a lutar, que seja para ganhar. Estas noções acompanharam-me muito antes de começar a praticar o Karate a sério. Pequeno desvio pela Avenida da Memória abaixo… Voltando ao tópico, saindo da ficção e reentrando na realidade, eu soube desta celebração via Facebook:



Soube também através do The Japan Times online, doutro facto interessante que me levou a escrever esta entrada. Esta entrada em grande parte é a tradução, com alguma liberdade poética, de um artigo do jornal supracitado. Como tal, toda essa tradução liberal será deixada a itálico. O restante é meu.

O artigo, escrito por Ayako Mie, fala-nos sobre o professor Byron Fija, de 42 anos. Ele é parte caucasiano norte-americano por parte do pai e japonês por parte da mãe. Esta última informação é pertinente pois é uma das razões pelas quais os japoneses muitas vezes pensam que ele é um estrangeiro. A outra razão pela qual isso acontece é o facto de ele falar o Okinawa hogen (o dialecto de Okinawa), chamado Uchinaguchi.
Os japoneses estranham que ele fale este dialecto, mesmo os seus conterrâneos de Okinawa, que deveriam entender o que ele está a dizer quando fala Uchinaguchi. Recentemente, num programa de televisão que festejava o aniversário dos 40 anos do retorno do governo de Okinawa ao Império do Japão, ele foi precisamente questionado sobre o porquê de ele falar um dialecto. A sua resposta foi assertiva: “Eu não falo num dialecto japonês, eu falo Uchinaguchi que é uma língua independente.”
Fija de facto ensina o Uchinaguchi, a língua falada na região meridional da ilha principal de Okinawa. Esta língua é, em geral, imperceptível à maioria dos japoneses. Mas apesar dessa fácil distinção, até os habitantes de Okinawa vêem o Uchinaguchi como um mero dialecto, subordinado ao Japonês. De facto, 11 dos 46 convidados do tal programa de televisão disseram esperar que esta língua ficasse extinta nas próximas décadas. Fija afirmou não compreender como os próprios japoneses de Okinawa negam a legitimidade do Uchinaguchi. Por outro lado, o professor admitiu que a sua campanha para promover esta língua é um tanto ou quanto pessoal, pois a descriminação desta língua faz parte da crise de identidade com que ele teve de lidar quando era criança, uma criança nascida fora de um casamento. Numa outra época, o professor seria sem dúvida desprezado como um dos Burakumin. Parece que a civilização japonesa já fez alguns progressos face à descriminação social.
Mas o anúncio de estes serem os últimos dias desta língua impulsionaram alguns japoneses de Okinawa, incluindo o sr Fija, a desenvolverem esforços no sentido de promoverem e protegerem o Uchinaguchi, que eles acham estar não só no coração da cultura única de Okinawa mas também da sua própria identidade.
Culturalmente, desde 1972, Okinawa tem-se forçado a si mesma a absorver a cultura dominante japonesa e nesses esforços desprezaram mesmo a sua própria língua, vista por muitos como inferior. O resultado deste traço cultural é que apenas um número reduzido de pessoas falam fluentemente esta língua, sobretudo os velhos de Okinawa.
Dando uma indicação clara de que o Uchinaguchi é uma língua e não um mero dialecto, a UNESCO indicou-a em 2009 como uma das 6 línguas em vias de extinção faladas em Okinawa e nas ilhas vizinhas de Amami. Contudo, o governo central japonês e a prefeitura de Okinawa ainda não tomaram medidas nenhumas para proteger esta língua ou sequer admitiram oficialmente que o Uchinaguchi é uma língua de pleno direito.
A concentração de instalações militares norte-americanas na prefeitura de Okinawa, quando comparada com outras regiões do Japão, é percebida pelas pessoas de Okinawa como uma descriminação, uma na qual o resto do Japão tem quase nenhum interesse. Contudo, a eliminação do Uchinaguchi deveria ser considera parte importante dessa descriminação, mas a verdade é que, por razões históricas, as pessoas de Okinawa não a entendem como tal. Outrora, Okinawa era o reino independente de Ryukyu, que governou as ilhas do sudeste, entre Kyushu e o Taiwan, entre os séculos XV e XIX, enriquecendo através do comércio com a China e o Sudeste Asiático. Mas em 1879, o Japão anexou essa nação e impôs políticas de assimilação cultural às populações locais, obrigando por exemplo a que apenas fosse permitido falar Japonês em público. Durante décadas, as pessoas de Okinawa foram descriminadas e ridicularizadas pelo resto do Japão por falarem uma língua considerada bárbara. De facto, nas escolas, os estudantes que falassem Uchinaguchi eram forçados a usar cartazes, que lhes pendiam do pescoço, que assinalassem a língua que falavam, sofrendo então todas as formas de humilhação social. Em 1945, morreu 30% da população local na Batalha de Okinawa, muitos dos quais falavam Uchinaguchi e foram mortos pelas tropas imperiais japonesas que os via como espiões do inimigo. Durante o tempo em que Okinawa esteve sob jugo Americano, após a Segunda Grande Guerra, e mesmo depois quando reverteu ao controlo do Japão, os habitantes de Okinawa que viviam fora da Prefeitura e que foram educados nas escolas da sua região mantiveram o Uchinaguchi vivo. Mas quando essas pessoas saíam da sua terra e iam para as metrópoles, como Osaka e Tokyo, em busca duma vida melhor, eram ridicularizados pelas suas raízes e pela língua que falavam, o que levou a que eles abandonassem a sua própria língua e a desprezassem a cultura de Okinawa, tratando-a como se fosse algo de segunda categoria.
Mas essa visão negativa não é vista nos habitantes de Okinawa nascidos após 1972.
Nos anos mais recentes, graças à projecção mediática de estrelas nascidas em Okinawa, a cultura de Okinawa começa a ser tida em consideração. Entre as estrelas que para tal contribuíram, encontram-se Namie Amuro (um cantor pop que se evidenciou nos anos noventa) e a popular jogadora de golf Ai Miyazato (que atingiu o topo do ranking mundial do golf feminino em 2010).
Ao mesmo tempo, a definição de Uchinaguchi entre as camadas jovens de Okinawa mudou significativamente. Muitos deles falam Uchina-Yamatoguchi, uma nova forma de expressão que mistura termos em Uchinaguchi com contextos japoneses. Uma sondagem de 2011, levada a cabo pelo jornal Ryukyu Shimpo (sedeado em Naha), concluiu que cerca de 90% da população de Okinawa entre os 20 e os 30 não conseguia falar ou perceber o Uchinaguchi tradicional.
Esta realidade lança sombras ameaçadoras sobre o futuro da dança e do teatro tradicionais de Okinawa, para os quais o Uchinaguchi é fundamental. De acordo com uma sondagem também de 2011, efectuada pelo professor Masahide Ishihara da Universidade de Ryukyu,  apenas 5% das 605 pessoas ligadas à cultura de Okinawa sondadas, com idades abaixo dos 30 anos, falavam fluentemente Uchinaguchi. Para Susumu Taira, um actor, produtor e guionista de Okinawa, com 78 anos, este declínio significa que a cultura de Okinawa está lentamente a tornar-se indistinguível da cultura de outras zonas do Japão. Segundo Taira, a vertente de teatro tradicional de Okinawa chamado Kumiodori, não tem um guião. São dadas deixas verbais aos actores, que depois têm a liberdade total para improvisar desde que consigam manter fluida a acção e a história. A não ser que os actores sejam fluentes em Uchinaguchi, não conseguem comunicar bem o sentimento desejado e toda a peça parecerá algo que pretensiosa. “Eu digo aos meus actores, que se as falas são ditas em Uchinaguchi sem haver uma entrega e abertura à língua, o seu desempenho vai ter o mesmo tipo de sensação e qualidade que teria se fosse desempenhado por actores naturais de Tóquio.”, disse Taira, nomeado em 1999 pela Prefeitura de Okinawa como Protector de Propriedades Culturais Intangíveis, o teatro e música de Ryukyu.
Contudo, tamanha singularidade não é bem recebida quando a audiência não entende a língua que está a ser falada em palco. De facto, para as peças de Kumiodori serem apreciadas pelas audiências, são acompanhadas de legendagem. O Kumiodori foi designado, em 2011, como Herança Cultural Intangível da Humanidade pela organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.
Taira confessou ter ficado chateado quando oficiais da Prefeitura lhe pediram que traduzisse algumas frases de Uchinaguchi para Japonês, com o objectivo de aumentar a popularidade da peça. “As artes performativas devem ser inteligíveis para todos sem mudar a tradição”, afirmou Taira. Sentindo-se ameaçado pela situação, Taira começou a ensinar Uchinaguchi na faculdade comunitária de Okinawa. O curso atraiu tanto habitantes locais como pessoas que vieram de fora da Prefeitura, nutrindo interesse pela cultura de Okinawa.
“Há certas palavras que são únicas em Uchinaguchi. Apercebi-me disso quando frequentei o curso.”, disse Keiko Shimoji, de 35 anos e residente em Okinawa.
Contudo, os esforços tanto dos locais que falam a língua e doutros que foram aprendê-la podem não ser suficientes para assegurar a sobrevivência da língua, pois é facto que os que a falam e ensinam estão a envelhecer. Para preservar a língua e elevar o seu status entre a população local, há aqueles que defendem de que esta deveria ter ensino obrigatório nas escolas. Dão como exemplo o caso bem sucedido do Havai, onde a língua nativa foi introduzida no ensino numa tentativa de a salvar, ao mesmo tempo que o estado declarou como língua oficial o Havaiano. Como um primeiro passo no intuito de adicionar ao currículo escolar o Uchinaguchi, a Prefeitura de Okinawa criou uma comissão em 2007 para gerar uma publicação que ajudasse ao ensino da língua nas escolas públicas. Mas nos últimos 5 anos, a complexidade e natureza diversa do Uchinaguchi têm impedido os estudiosos de decidir exactamente como codificar a língua e compilar o manual em questão. É que mesmo dentro da própria língua, existem vários dialectos falados na região sul de Okinawa. Tais diferenças existem para todas as 6 línguas diferentes – incluindo as formas faladas Amami-Oshima, Yaeyama, Miyako e outras ilhas do sudeste – declaradas com em perigo pela UNESCO. É por isto que peritos afirmam que mesmo linguistas e oficiais do governo não podem determinar qual dos dialectos codificar e tornar o standard.

À parte: para mim é simples a resolução deste problema. Codificam-se as 6 formas da língua, ensinando-se cada uma na região onde são ainda faladas. Trabalhoso, mas decerto fazível.

“Quando decidirmos que Uchinaguchi codificar, tornar-se-á mais fácil compilar um manual de ensino.”, disse Shinsho Miyara, professor jubilado da Universidade de Ryukyu, que faz parte do painel da Prefeitura designado para criar o manual.
Alguns peritos também realçam que as políticas de assimilação também dificultaram a estandardização da língua. “Como a intenção sob a administração colonial japonesa foi de que toda a gente assimilasse e aprendesse o Japonês, não houve qualquer iniciativa governamental para a estandardização do Uchinaguchi numa língua de pleno direito”, disse Ryan Yokota, doutorando de História na Universidade de Chicago e especialista em matérias pós-guerra em Okinawa.
Apesar dos seus esforços, os oficiais da Prefeitura de Okinawa dizem que o ensino obrigatório do Uchinaguchi nas escolas locais provavelmente não vai acontecer, uma vez que o governo central japonês nem a reconhece como uma língua separada.
Já o professor Fija, diz que é tempo das pessoas de Okinawa abraçarem a mais fundamental fonte da sua identidade. “Enquanto continuarmos a rotular o Uchinaguchi como um dialecto ou uma língua de segunda classe, vamos estar a tratar-nos a nós mesmos como cidadãos de segunda.”, afirmou Fija.

Ora, nós em Portugal temos um caso semelhante, felizmente menos complicado. Falo é claro da segunda língua oficial de Portugal, o Mirandês. “Em 2008 foi estabelecida uma convenção ortográfica, patrocinada pela Câmara Municipal de Miranda do Douro e levada a cabo por um grupo de entendidos linguistas, com vista estabelecer regras claras para escrever, ler e ensinar o mirandês bem como estabelecer uma escrita o mais unitária possível e consagrar o mirandês como língua minoritária de Portugal.”, in Wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_mirandesa). Provavelmente menos pessoas falam o mirandês que o Uchinaguchi, mas como faz parte da nossa herança cultural decidimos, para meu gáudio e orgulho, salvaguardá-lo. Eis algumas das medidas de defesa e perpetuação da língua mirandesa:
“O mirandês é ameaçado actualmente pelo desenvolvimento, a vida moderna, a televisão, e as pressões do português e do castelhano. Em sua defesa, foram tomadas as medidas:
  • ensino em mirandês, como opção, nas escolas do ensino básico do concelho de Miranda do Douro, desde 1986/1987, por autorização ministerial de 9 de Setembro de 1985.
  • publicação de livros sobre e em mirandês, pela Câmara Municipal de Miranda do Douro.
  • realização anual de um festival da canção e de um concurso literário, pela Câmara Municipal.
  • uso do mirandês em festas e celebrações da cidade e, ocasionalmente, nos meios de comunicação social.
  • publicação de dois volumes da série de banda desenhada Asterix.
  • tradução de todas as placas toponímicas da cidade de Miranda do Douro, efectuada em 2006 pela Câmara Municipal
  • estudo por centros de investigação portugueses como o centro de linguística da Universidade de Lisboa com o projecto "Atlas Linguístico de Portugal", e a Universidade de Coimbra, com o "Inquérito Linguístico Bolêo".
  • criação de uma Wikipédia em Mirandês, a Biquipédia.
  • disponibilização de sítios em Mirandês, entre eles hi5, Photoblog e WordPress em Mirandês.”




Portanto o que aqui interessa não é a quantidade de pessoas que fala uma língua, ou que a escreve, mas sim a sua riqueza cultural, a salvaguarda do pluralismo cultural, tão importante para a evolução de um povo como o pluralismo genético é para a evolução de uma espécie. Nunca me esqueço de uma frase dita por Lawrence das Arábias a Indiana Jones, no primeiro episódio da série televisiva desta última personagem que relatava as suas aventuras em criança e em adolescente. “Henry, onde quer que vás, sejam quais forem os países que visites, aprende a língua. É a chave que abre tudo.” Foi esta frase que me levou a querer aprender inglês, sendo que quando cheguei ao ciclo, embora não o lesse nem o escrevesse, já tinha considerável fluência oral no inglês americano. Nós temos um espírito, uma alma, quanto mais não seja até morrermos (para lá desse momento, não se sabe o que acontece). Essa alma é a composição de todas as sensações que vivemos, memórias que retemos e saberes que aprendemos. Sendo assim, a alma de um povo será a composição das suas tradições e História, das quais a Língua é, ou para povos sortudos as Línguas são, fulcral(ais).

Já agora, impõe-se uma questão. Se nós procuramos por todos os meios salvar línguas que poucos falam, que peso tem o argumento dos números para justificar o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AO’90)?
A resposta tem de ser rápida e decisiva. É um argumento inválido. O facto é que o Português Europeu nunca esteve ameaçado ou em vias de extinção como os alarmistas defensores do AO’90 quiseram que acreditássemos. Desde a fundação deste país até aos dias de hoje, fomos sempre poucos em números, sendo que provavelmente nunca houve tantos portugueses como há hoje em dia. Como é sequer concebível levar o argumento dos números a sério? A verdade é que o injustificável não pode ser justificado por argumentos válidos, então há que inventar argumentos por mais absurdos que sejam. Já falei a grande extensão dos erros técnicos e incongruências do (des)Acordo Ortográfico no post Desacordo Ortográfico e Democracia:
Neste falei também de que é um acordo anti-democrático pois foi feito contra a vontade dos povos (até o Miguel Sousa Tavares dá testemunho disso melhor que o meu pois ele foi ao Brasil, falou com brasileiros e diz que ainda não encontrou um que quisesse o AO) que afecta, ou no mínimo se lhes consultar a opinião. Por outro lado, numa democracia, escutam-se as minorias e desde que estas não coloquem em risco o bem da maioria, procura-se salvaguardar os seus direitos. O problema é que o AO’90 é uma imposição de uma minoria restrita sob mais de 4 povos diferentes, com o pretexto de salvar uma língua que nunca esteve em risco, através duma evolução forçada e contra-natura que ameaça ela sim o pluralismo e riqueza do Português nas suas variadas formas.
E os nossos políticos defendem esse acordo sem sequer o entenderem:

É que nem os defensores do AO’90 o entendem ou conhecem:
Fazem lembrar aqueles zelotas cristãos que defendem de forma acérrima a sua religião mas nunca leram a Bíblia que é só o pilar central de toda a crença deles. Mas pronto, quem acredita não requer provas ou argumentos lógicos. ["The US Religious Knowledge Survey, released Tuesday from the Pew Forum on Religion & Public Life, found atheists and agnostics know more basic facts about the Bible than either Protestants or Catholics.", fonte: http://www.csmonitor.com/USA/Society/2010/0928/In-US-atheists-know-religion-better-than-believers.-Is-that-bad Só para dar peso ao argumento.] Será então o acordês uma neo-crença dogmática? God, let us hope not!

Mas ainda vamos muito bem a tempo de desfazer esta insanidade cultural pretensiosa, hipócrita e disfarçada de sabedoria, através da Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico de 1990 (ILCcontraAO’90).
Para lerem a ILCcontraAO’90, vão a: http://ilcao.cedilha.net/
Podem encontrar o formulário para a assinarem em:
Para preencherem necessitarão do vosso número de eleitor que, estando em posse do vosso BI ou Cartão do Cidadão, podem saber através de:
ou através de uma SMS para o 3838 com o texto:

REespaçoN.ºId.CivilespaçoDatadeNascimento(AAAAMMDD)

Exemplo: RE 1234567 19751014

Eu já reuni 4 assinaturas (só comecei a semana passada eheh), incluindo a minha, e espero reunir mais umas quantas para depois enviar por correio para a morada:

Apartado 53
2776-901 Carcavelos

Há ainda uma série de sítios espalhados pelo país onde poderão preencher o formulário, assiná-lo e entregar sem mais gastos. Podem saber onde o poderão fazer através do seguinte link:

Cidadãos, as vossas canetas são precisas para salvaguardar a alma do nosso povo. Evolução sim, mas uma evolução natural quando muito auxiliada com rigor técnico, nunca aos caprichos de uns quantos que se têm em demasiada alta conta e que têm o desplante de dar o único parecer técnico positivo ao documento que eles próprios compuseram.

Alex, signing off 4 the momment!

P.P.S.: Só para completar... mesmo que o argumento dos números relativamente ao AO'90 tivesse qualquer mérito, o Destino (esse que domina até os Deuses, segundo os poetas neoclássicos) entregou-nos a forma perfeita de espalhar o Português Europeu pelo Mundo. Ora atentem às seguintes notícias de há uns meses:


Não há povo mais numeroso que o Chinês, é só metê-los a falar/escrever Português Europeu e 'tá feito, meus amigos! :D Isso sim, seria uma jogada à Dom Afonso Henriques, o cavaleiro-rei que entendeu em pleno século XII que a religião era apenas a política da época! ;)
Contudo, eu fico satisfeito se os 10,5 milhões deste pedacinho de terra, esta aldeia de irredutíveis lusitanos, não fiquem privados da sua herança cultural. Nem mesmo de 4% desta.