segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Desacordos e Cultura

Boas!
Esta é apenas uma daquelas entradas que faço ocasionalmente para veicular informação sobre eventos e cultura, essencialmente promovida pela Embaixada do Japão, mas não só. Exemplo de algo que nada tem a ver com o Japão mas antes com a cultura Portuguesa, é esta peça sobre a qual vos aviso no banner abaixo. Para quem viver em Lisboa, é de aproveitar. Produto nacional. É preciso apoiar e estimular a cultura, já que o governo só a desgoverna como tudo o resto.
De seguida, abordemos então o último boletim informativo da Embaixada do Japão. Ao invés de me mandarem um email com as informações, mandaram-me apenas o link para o pdf informativo do site oficial da Embaixada. Normalmente, o que eu faço em qualquer dos casos é copiar as novidades, corrigir o Português Acordo Ortográfico de 1990 (AO90) para o Português Europeu e deixar-vos a informação aqui na página. Desta volta contudo, vou deixar-vos uma imagem e o link em questão. Porquê? Bem, precisamente por causa duma das batalhas culturais nas quais estou inserido, a guerra contra o AO90.
Na imagem acima, vêem um print screen da minha caixa de correio. Se olharem com olhos de ver, percebem, como eu percebi, que não vem escrito segundo o AO90, que a Embaixada Japonesa tem já vindo a usar. Isso percebe-se pelo simples facto de Fevereiro não começar com “f”, mas sim com “F”. O “Sector” em “Sector Cultural” nunca perder o “c”, embora os anúncios de eventos e actividades já viessem segundo o AO90 e as datas também. Pelo menos, nos últimos emails:
Mas não neste. Agradado mas desconfiado, cliquei no link e avancei para o pdf. Peço-vos que façam o mesmo, vai abrir numa outra janela:


Ora, vendo o primeiro anúncio do pdf, nota-se distintamente uma “expectativa” com “c”, mas também um “refletido” sem “c”. Tal poderia dever-se ao autor do texto ter aprendido português brasileiro, mas ainda assim a construção frásica é mais próxima do português europeu. Isto leva-me a crer que o problema aqui é que as pessoas já não sabem a quantas andam a nível ortográfico. Este Desacordo Ortográfico não unificou a ortografia portuguesa, tornou-a sem regra e caótica. Quando um jornal se dá ao luxo de criar a sua própria versão do Acordo Ortográfico (acordado por mais ninguém que pelo jornal, e ainda assim tão válido quanto o AO90) como fez o Correio da Manhã, vale tudo.
Voltando ao pdf, no segundo anúncio, temos novamente os meses com iniciais maiúsculas, que é contrário ao AO90, mas no terceiro parágrafo já temos Janeiro com inicial minúscula. No quarto parágrafo, temos Fevereiro com maiúsculas. Avançando para o anúncio “Estás a Mangar comigo?”, temos uma “actividade” com “c” e os meses com maiúsculas. Depois no anúncio da Conferência sobre o desenvolvimento do Brasil, já aparece Fevereiro com inicial minúscula e “Diretor”. Nos dois anúncios seguintes, temos os meses com iniciais maiúsculas e no anúncio que se segue a esses dois voltamos às iniciais minúsculas nos meses. Que canseira, que (des)regra!!
O que eu espero, desejo, é que a Embaixada do Japão tenha visto a luz, com a recente recusa do Brasil quanto ao AO90, e pare de tentar implementá-lo. Esta hesitação agrada-me. É um recuo por parte duma entidade política, ao mesmo tempo que cada vez mais vozes se erguem contra o AO90 nos três continentes intervenientes deste acordo. No mínimo dos mínimos, essa mesmo entidade dá a entender que é sabido que embora o governo português pareça resoluto na imposição do dito (des)acordo, que ainda há em Portugal (já nem falo no resto da Lusofonia) pelo menos duas ortografias correntes.
Ainda recentemente numa audição parlamentar sobre o AO90 (vidé vídeo acima, onde são apresentados também argumentos mais que suficientes dos pontos de vista formal, técnico e prático contra este AO90), ouve-se uma deputada dizer que já lhe foi dada a indicação de que cerca de 63% dos portugueses não querem o AO90. Como é isto compatível com o Ministro dos Negócios Estrangeiros de um governo de maioria absoluta, que como tal pretende-se ser o reflexo da maioria dos portugueses, venha depois dizer que não há divergências quanto ao Acordo Ortográfico e que ele entrará em vigor em 2015??? Estão a Mangar Comigo???? (private joke para quem leu o boletim da Embaixada do Japão lá em cima)



Isto é patético, mesquinho e abertamente anti-democrático! Uma piada de mau gosto e sem graça, é o que é o AO90!

Eu por mim contentava-me com um referendo nacional e caso o meu lado perca, eu aceito a voz da maioria. Venha ele! Buga lá! Também já ouvi o argumento de que nenhum Acordo Ortográfico alguma vez foi discutido com o povo. E isso é lá razão para que este não o seja? Dantes também havia escravos. Dantes as mulheres não votavam. A ideia é aprimorar e aumentar a democracia e não asfixiá-la.
Há ainda um outro argumento, fraco na melhor das hipóteses, em defesa do acordo ortográfico, que eu li esta semana. Disse (não cito, parafraseio) então um apologista do AO90 cujo nome agora me falha: “O acordo ortográfico tem incongruências? E depois? A ortografia anterior também as tem. Há sempre hipótese de melhoria.” Até é verdade, o problema é que para melhorarmos, para evoluirmos, nada melhor que o método científico, o rigor lógico, e acima de tudo só mudarmos se for para melhor. O problema é que o AO90 apenas torna a ortografia portuguesa mais ambígua, as novas regras não têm base científica mas antes noções ultrapassadas como a “pronúncia culta” (isto sim, do tempo do senhor do Encarnado que tinha medo dos Vermelhos) e são feitas por capricho, como vos pode confirmar o testemunho do vídeo acima, etc… Não admira que Portugal esteja com uma perspectiva de futuro tão negra, quando se predispõe a aceitar que a sua cultura, ciência, educação e governo sejam ditadas por homens (e mulheres), e aqui parafraseio Tolkien (e/ou José Hermano Saraiva), "menores"!
Mais uma vez apelo junto de vós, senhores e senhoras, amigos e amigas, irmãos e irmãs, camaradas, conterrâneos e pessoal D’além Mar, ergam as vossas vozes e as vossas canetas e/ou teclados contra esta farsa, que ameaça a verdadeira riqueza, encontrada na sua diversidade, da língua Portuguesa. Há 18 ortografias da língua inglesa na Internet. Podia, devia, haver 8 da língua Portuguesa, mas só havia 2 e agora querem que só haja 1 e que tenha esta forma anedótica? Isto é progresso ou suicídio cultural?
Assinem a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico de 1990 (links abaixo)










E se quiserem também subscrever à carta enviada ao ministro da Educação, link abaixo, onde podem ler e subscrever a dita carta:
https://docs.google.com/spreadsheet/viewform?formkey=dG13TnlWRk10UXd0cDJvZTViS0picWc6MQ&fb_source=message#gid=0 


Obrigado por me lerem e voltamos a encontrar-nos em breve!
Sayonara, people! ;)

P.S.: Ah e mais uma vez… bão ao Teatro, carago! É a ciiiinnnccco (5) aéreos! Olh’ó Teatro fresquinho!



quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

1 Versículo Satânico 4 St Valentine



Quão próximas estão agora culturas que eram tão distantes, neste nosso berlinde azul, supra globalizado e “ubermercantilizado”. Louvado seja o todo poderoso Cifrão (não, não me refiro aos D’zrt!!) por nos dar o Dia de S. Valentim.
Qual o Natal, este dia pouco ou nada tem a ver com o que diz ser a sua premissa ou razão de ser, nos nossos tempos. Não, não é o amor ou o romance que interessam neste (porque não?) amaldiçoado dia, mas sim o quanto se gasta para agradar o/a respectivo(a) “mais-que-tudo”.
Mas enquanto deste lado do mundo o ónus da responsabilidade historicamente [até porque hoje em dia com a igualdade de direitos, espero eu exista também a igualdade de deveres] reside nos ombros do cavalheiro que deve de presentear a sua donzela com algo magnificamente caro, do outro lado do mundo, mais precisamente no Japão, são as mulheres que neste malfadado dia 14 de Fevereiro afluem às lojas de chocolates nipónicas impulsionadas por um dever semelhante. E neste último caso, não têm só de comprar a pensar no namorado ou no marido, oh não! O dever manda comprar igualmente para os colegas de trabalho e para os chefes.
Long live the almighty dollar! In God we trust! (e aqui uso dólar porque até há bem pouco tempo era a moeda internacional por excelência e porque me permitiu usar aquele mote tão delicioso que vem nas notas americanas e assim evocar o Senhor em vão. Não o fazer num versículo satânico é sacrilégio!)
O Chocolate está disponível no Japão desde pelo menos 1797, quando era oferendado às prostitutas por mercadores holandeses (que eram na altura os únicos europeus aos quais era permitida uma presença contínua num país que estava de qualquer outra forma isolado do mundo e onde a viagem para o estrangeiro pelos seus cidadãos era crime punível com pena capital). De certa forma, é engraçado que agora sejam as mulheres a ter que dar aos homens.
Hoje em dia, contudo, o Japão tem uma indústria chocolateira de 11 biliões de dólares que é impulsionada por dias especiais, como o de São Valentim. Estes dias são por sua vez gerados e/ou mantidos pela acção de uma vasta maquinaria publicitária (a.k.a. propaganda). Crê-se que metade do total supra mencionado seja obtido em Fevereiro.
E mais uma vez, a economia serve de régua de medir os homens, que são todos iguais, embora uns sejam mais iguais que outros… atrevo-me eu a roubar aqui a Orwell. Para os mais-que-tudo compra-se dos chocolates mais caros, o chocolate honmei (verdadeiro amor), para os colegas de trabalho e para os chefes compra-se do chocolate mais barato, a que se chama chocolate giri (dever). O pessoal do marketing já anda a congeminar um terceiro tipo de chocolate, feito para as mulheres oferecerem às colegas, que se chamará chocolate tomo. Tomo é um diminutivo de tomodachi que quer dizer “amigo(a)” em japonês.
No Japão, uma mulher chega a gastar algo que ronda os 10mil yen, cerca de 100 dólares, ou uns 75 euros, de chocolates neste dia. E as marcas de chocolate estrangeiras (id est, não japonesas) investem cada vez mais neste mercado. Este país é o maior mercado de chocolate na Ásia e comporta uma enorme fatia do mercado mundial do chocolate. O dia de São Valentim surgiu no Japão no final dos anos 1950, quando a economia do país voltava a erguer-se após os magros anos que se seguiram à II Grande Guerra. Os produtos estrangeiros trouxeram ares de luxo e riqueza a uma nação que já há muito sofria de uma impiedosa austeridade. Foi então que uma firma chamada Mary Chocolate (será prima da Bolacha Maria?! oO) começou a publicitar o dia de São Valentim como “the only day of the year a woman professes her love through presenting chocolate”. A norma foi assim criada e os outros produtos oferecidos neste dia noutras partes do mundo, como jóias, flores e roupa, foram banidos do 14 de Fevereiro Japonês, em favor do chocolate. E sejamos sinceros, faz sentido, afinal a reacção química gerada pela ingestão de chocolate no cérebro humano é (embora em menor escala) idêntica à dum orgasmo. E todos nós sabemos que para o técnico de marketing sexo vende, por isso sexo é amor!
Corta para duas décadas mais tarde, diz o realizador deste filme a que chamamos História (será que no IMDb os créditos nomeiam Deus ou os historiadores?), e os génios do Marketing surgiram com a ideia do 14 de Março, dia no qual os homens japoneses têm o dever de presentear as mulheres com uma prenda branca, tendo este dia sido apelidado de White Day. É o dia simétrico do 14 de Fevereiro na economia nipónica. No início, a praxe era oferecer marshmallows (tão pouco japonês e tão americano, já repararam? To the victor goes the spoils indeed!), mas hoje em dia qualquer coisa branca é permitida e ao que parece os artigos mais vendidos são as lingeries brancas… the boys got smart! :D
Por terras lusas, a Maxim Portugal, a revista que continua a dar, andou a distribuir gratuitamente chocolates na Baixa Lisboeta, numa acção de marketing desenhada em especial para este dia e que é fruto duma acção conjunta da Regina e da Maxim. Como gosto muito do chocolate da Regina e até curto a Maxim (quanto mais não seja por não ter aderido ao (des)acordo ortográfico e por dar prendinhas todos os meses! Hey, vivo num mundo capitalista, é claro que sou interesseiro ;), espero que a campanha seja um sucesso.
Resumindo:
A nossa aldeia economicamente global
Está cada vez mais culturalmente igual,
Graças à força surpreendente do vil metal.

Este dia de São Valentim devia deixar de se fazer passar pelo dia do Amor e assumir-se como o dia mundial da Economia, mas sem a hipocrisia lá morria o feitiço. Faz-me lembrar o Ministério do Amor de Orwell, com os seus horários do Ódio. Cá em Portugal onde o Governo parece feliz por forçar mais e mais pessoas à fome, surgiu agora a Secretaria de Estado da Alimentação. Oh sweet hypocrasy feel me with joy!
Espero que tenha sido um feliz 14 de Fevereiro para todos.



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Fontes: