Hoje foi o Dia Mundial do Teatro.
Embora eu seja da opinião que um destes dias teremos um problema do caraças e
teremos de voltar a alterar os nossos calendários, ou mesmo a reestruturá-los
(como a dívida, ‘tão a ver?), porque já não teremos dias suficientes para todas
as coisas cujo celebrar queremos consagrar com um dado dia, este é um dia que
eu acho importante celebrar. E porquê?
O teatro é parte integrante de ser humano.
Não, não estou a exagerar. Quando em pequenos fazemos birra, explodindo em
choro por vezes sem razão nenhuma só para conseguirmos o que queremos, que é
isso se não um teatro? Quando mais tarde pegamos em bonecos, utensílios de
brincar ou apenas na nossa imaginação e nos tornamos em personagens de
aventuras imaginárias que nos ajudam a passar o dia e também a crescer e a
aprender, que mais estamos a fazer se não teatro? E mesmo não fazendo parte
daquela classe que ainda em adultos têm o privilégio de continuar a brincar ao
faz-de-conta, sendo para isso pagos, todos nós continuamos a ambicionar essa
magia que nos pode levar a fazer rir, chorar, saltar de pavor, deixar
melancólicos ou inspirar a mudar a nossa vida, essa magia do faz-de-conta que
nos traz ao de cima a criança que há em nós.
Pode ser que o cinema e as séries
televisivas sejam uma forma de teatro moderna, mas todos facilmente
reconhecemos que no teatro dificilmente há take 2 e que se as coisas correm
mal, ou o actor dá a volta rapidamente ao texto e os seus colegas o acompanham
ou tudo falha. Para além disso, a relação entre o público e a plateia é íntima
e não distante como as dos grande e pequeno ecrãs. Se é uma comédia que está a
ser encenada e não há risos na plateia, isso afectará negativamente o
desempenho do actor. O inverso é também verdade. Gera-se assim um espectáculo
que é influenciado pela empatia humana. É essa ligação empática, quasi-telepática,
que separa o teatro do cinema e da televisão. Além de que, claro está, o teatro
é milenar e o cinema não mais que centenário.
Também passam teatro na
televisão, por exemplo na RTP Memória as revistas à portuguesa ou mesmo os
episódios de Wrestling importados dos EUA. Mas não é a mesma coisa. Falta a
empatia. Eu percebi isso, estranhamente, graças ao Youtube. Descobri em 2012
que haviam encenado um musical de um dos meus filmes de culto favoritos, The
Evil Dead. Procurei no Youtube e encontrei a peça em questão, isto é, encontrei
uma videogravação da mesma. Embora a peça tenha feito imenso sucesso, embora eu
goste de teatro, de musicais e do material fonte, não consegui achar piada
àquilo em vídeo. Faltava a empatia, a atmosfera.
Eu já pisei um palco amador uma
vez, ainda muito novo, e quase por achar que tinha algo a provar… a coisa
correu mal e jurei para nunca mais. A minha fez teatro amador na sua juventude
e ao que parece o meu avô, seu pai, também. Eu sempre preferi encenar peças com
os meus bonecos. Mas até já essa capacidade perdi. Resta-me ver teatro… nem que
seja o Sócrates, o Passos, o Seguro e o Portas, actores que seguem o Método sem
dúvida, a mentirem ao país. É mau teatro, é pior que amador, é reles, mas é
teatro ainda assim.
É trágico que tenhamos, já que
toquei na política, um Presidente da República que vê um enorme potencial na
Língua Portuguesa (ideia errónea que desmascararei quando voltar a falar do
Acordo Ortográfico de 1990, me aguarrrdem!), um enorme potencial do Mar (no
qual nada faz para que neste se invista, sendo que já tenha no passado feito
muito para remover qualquer investimento nesta área), mas que não reconhece o
imenso potencial económico das artes cénicas. Sim, porque se isto da dinheiro
na Broadway, também o pode dar cá. Tal como o Cinema, já agora. Mas para a
Direita Portuguesa, a cultura mais não merece que uma mísera Secretaria de
Estado e os actores mais não são que “prestadores de serviços”. Quando este
governo tomou posse, um dos seus membros originais veio anunciar que a guerra
de classes havia acabado. Para tal, este governo prontificou-se a acabar com as
classes. Quase o conseguiu: destroçou ou afugentou a parte da classe média que
sobrevivera ao jugo de Sócrates e eliminou toda uma classe (a dos actores)
despojando-os para efeitos fiscais do seu nome de classe, tornando-os
indistintos prestadores de serviços. O Ruy de Carvalho, que cometeu o erro deneles votar, que o diga.
Verdade seja dita que não é só o
Ruy (e trato-o assim porque além de individuo de pleno direito, o senhor é um
tesouro nacional, o que o faz um pouquinho de todos nós) que se queixa, na
minha opinião com razão, mas várias gerações de actores.
Dá vontade de desejar muita merda
aos nossos governantes e aos seus mesquinhos e curtos horizontes, subjugá-los a
uma forçada emigração por via de uma chuva de patacas furibundas! Hey, o teatro
sempre serviu para castigar os costumes e satirizar a sociedade, revelando-lhe
os podres, certo?
Já agora, sabeis acaso, caro
leitor, porque é que é de bom tom desejar muita merda a um profissional do
teatro que tenha uma peça a estrear? Parece que em tempos idos, a nobreza ia ao
teatro de coche. Se a afluência a um dada peça fosse grande, a entrada do
teatro em questão ficaria ladrilhada de merda de cavalo. Este hábito de merdoso mas simpático desejar foi mais uma importação francesa do séc XIX.
Como disse o José
Hermano Saraiva, em relação a um dos 12 trabalhos do Hércules que consistia em
limpar os estábulos dos deuses: “Meus amigos, era muita bosta!
Mas a culpa é também nossa, do
povo. Ah pois é! Antes de mais por, em geral nós (embora voto meu, e eu voto,
jamais tenha eleito um governo), elegermos paspalhos sem ideias nem cultura,
nalguns casos que se fazem até chamar de doutor sem nem uma licenciatura terem,
que a troco dumas migalhas das grandes cortes europeias e duma boa próxima vida
após a chamada “morte política” prontamente se predispõem não só a estragar o
nosso país como a enterrar a nossa cultura e identidade. Depois, porque não
vamos ao Teatro, não apoiamos Cinema Português, etc… Agora é da crise, que até
é uma boa justificação, mas e nos tempos das vacas gordas, porque é que os
teatros eram tão pouco frequentados em terras lusas? Em Torres Novas, de onde
oriundo, havia um teatro que no meio tempo era cinema (foi onde de facto vi
tanto o meu primeiro filme e a minha primeira peça de teatro, de que me
lembre), que passou muitos anos fechado e abandonado, e foi recentemente
recuperado pela Câmara, mas é muito pouco usado. E contudo, na minha
adolescência, tive a felicidade de quase todas as semanas ir ao cinema, ver um
filme que estreava.
A imagem acima foi retirado do facebook de uma jovem actriz, que é também a miss CPLP 2013, a qual eu já tive o prazer de ver ao vivo, numa peça, podendo assim afirmar-vos que é bem mais que uma carinha laroca, até porque é excelente com uma máscara!
Embora muitas destas imagens exibam manequins vestidos com kimonos tradicionais japoneses, as fotos foram tiradas no palco do Teatro Nacional Dom Carlos, o qual visitei em 2012. As fotos das e sobre as patacas também vieram de lá.
Antes de começar a falar do teatro japonês (porque
afinal o blog é centrado no Japão), queria só, uma vez que é o Dia do Teatro,
falar-vos duma iniciativa bem portuguesa que em tudo me agrada e que está
relacionada com a imagem que abre este post. Refiro-me ao restauro do Palácio
do Bolhão, no Porto, pela a Academia Contemporânea de Espectáculo, em prol do Teatro
do Bolhão. Nesta iniciativa, sobre a qual melhor se podem informar no link
abaixo, procura-se, ao mesmo tempo que se dá uma casa à nobre arte, restaurar
um monumento nacional. Poderá haver causa cultural mais digna de ajuda? Em
troca de pequeno contributo monetário, podem ver o vosso nome imortalizado num
palácio da Invicta. Acho que é uma muito bela troca, se bem que injusta para a
iniciativa em si que recebe apenas dinheiro. ;)
Na Língua Japonesa (e segundo o
tradutor da Google), Gekijō (劇場) é como se
diz Teatro (Link para ouvir Pronúncia – vale a pena, pois parece quase um
bramido de ovelha). Como em todas as grandes civilizações, o teatro é central
na cultura nipónica, tendo evoluído, tal como no caso português, em várias
formas: o Noh, o Kabuki, o Bunraku e ainda o teatro negro (não se preocupem,
nada tem de racista eheh).
O teatro Noh, cujo nome deriva da
palavra sino-nipónica para “perícia”, é uma das principais formas clássicas de
drama musical japonesas, e é encenada desde pelo menos do século XIII D.C,
sendo que a sua forma actual começou no período Muromachi. Muitas das suas
personagens estão mascaradas e os actores, sempre homens, interpretam tanto papéis
masculinos como femininos. Tradicionalmente, um “dia de teatro Noh” dura mesmo
todo o dia e consiste em cinco peças Noh, intercaladas de peças Kyogen, peças
mais curtas e humorísticas cujo o nome quer dizer literalmente “palavras
loucas” ou “discurso selvagem”. Presentemente, o teatro Noh consiste em apenas
duas peças Noh, intercaladas por uma peça Kyogen. É um campo de teatro muito
codificado e fortemente, regulado pelo sistema Iemoto, que dá prioridade à
tradição em detrimento da inovação. Mesmo assim, há quem faça reviver peças
antigas e já abandonadas, há quem componha peças novas e mesmo quem crie peças
que mescle esta variante com outras suas pares.
O teatro Kabuki, composto pelos
kanji 歌(cantar)舞(dançar)伎(habilidade), sendo por vezes
traduzido de forma simplista para “a arte de cantar e dançar”, consiste numa
forma muito estilizada de drama, com ênfase na maquilhagem dos artistas.
Julga-se que o nome derive do verbo japonês Kabuku, que pode significar
“encostar” ou “ser fora do vulgar”, sendo assim uma arte teatral que executa
peças bizarras ou experimentais, a vanguarda do teatro tradicional japonês. De
facto, o termo kabukimono é usado para designar pessoas que tenham uma forma
bizarra ou fora da norma de se vestir no sei dia a dia. É muito mais novo que o
Noh, tendo sido originado no século XVI D.C., período Edo da História do Japão,
quando Izumo no Okuno, uma sacerdotisa do Shintoísmo, em 1603 começou a
desempenhar uma nova forma de dança nos leitos secos dos rios, em Quioto. Este
é portanto o polar oposto do Noh, tendo actrizes a desempenhar os papéis
masculinos e femininos do quotidiano nipónico. Um dos factores que tornou esta
forma teatral muito apelativa foi o facto de muitas das trupes que a
desempenhavam estarem receptivas à prostituição. De facto, o kabuki tornou-se
norma no red light district de Edo, capital do Japão, actualmente conhecida
como Tóquio.
O teatro Bunraku, também chamado Ningyo Joruri, é a versão
japonesa de uma peça de marionetas. A componente física desempenhada pelos
mestres de marionetas, designados de Ningyotsukai, é acompanhada de uma componente
musical, os cantadores chamados Tayu e os tocadores de Shamisen (espécie de
banjo japonês). Por vezes, também juntam tambores taiko à peça. A combinação do
canto acompanhado pela melodia do shamisen é chamada de joruri e ningyo quer
dizer marioneta. Já o termo Bunraku surge do nome de um teatro muito conhecido
no Japão por exibir esta arte.
Por último, quero ainda referir o Teatro Negro, cuja técnica pode
também ser usada no Bunraku para colocar toda a atenção nas marionetas, e sobre
o qual deixo um exemplo em baixo, porque é deveras difícil de explicar por
palavras!
Isto foi só um lamiré, porque cada um destes estilos é um mundo, e
o mesmo pode ser dito das formas ocidentais, o drama, a comédia, a sátira, etc…
Um dia destes, aprofundarei, num post para cada uma, as formas japonesas aqui
para o blog. Quem sabe se não inspiro algum encenador a fundir alguns dos seus
elementos com os nossos estilos? Ao mesmo tempo, continuarei a veícular esta e outras iniciativas em prol da cultura e das artes.
Viva o Teatro, onde a arte não só imita a vida, como está viva, e como toda a vida merece ser protegida!
E agora para vos despachar com bom humor, tomodachi, fiquem com um teatrinho radiofónico, cortesia do Nuno Markl e da malta das manhãs da Comercial.
Sayonara... por agora!
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