sábado, 10 de dezembro de 2011

Shinobi - Parte 1

Como já devem ter percebido, a minha paixão pela cultura japonesa é igualada pela minha paixão por cinema. Como tal, tenho andado a magicar uma curta-metragem que tenha a ver com o Japão.
Os parâmetros para esta curta-metragem são óbvios: tem de envolver pouca gente, não pode exigir muito em termos de cenário, e tem de poder ser contada em 30 minutos ou menos! Ah sim, como infelizmente não tenho nenhum amigo japonês, as personagens japonesas da curta não podem mostrar a cara.
Pois é, adivinharam... vou mesmo ter de meter ninjas ao barulho!
A verdade é que evitei falar deles. Não por medo ou superstição. Sou ocidental e estou a léguas do Japão, além de ser tão insignificante que nenhum ninja alguma vez me poderá desejar silenciar. Apenas porque já tinha feito dois longos posts sobre samurai e, embora as duas palavras dêem nome ao blog, não queria restringir-me só a isso. Mas já dei mostras, post após post, de que consigo abordar muitos outros tópicos relacionados com o Japão e com isso ganhei o direito,perante mim mesmo, de escrever sobre os Ninjas.
Ora bem, na verdade não se sabe assim muito sobre eles. Já referenciei, no primeiríssimo post que fiz neste blog, a página da Wikipédia sobre o tópico, escrita em Português do Brasil. A página está boa, mas incompleta. Procurarei não dizer o que nesta já foi dito, mas antes completá-la, essencialmente traduzindo certas partes da sua homóloga em Inglês.
Comecemos pela etimologia (assunto que enquanto escritor também adoro e que trata a origem e significado dos nomes) das palavras ninja e shinobi, que são sinónimos!Na imagem abaixo e à esquerda, podemos ver os caracteres kanji que designam a palavra ninja, através duma leitura on’yomi (uma maneira de ler kanji influenciada pelo chinês medieval). Se a leitura for feita no estilo nativo japonês chamado kun’yomi, os mesmos caracteres lêem-se shinobi, nome que é diminutivo do nome composto shinobi-no-mono (忍の者). Ou seja, os dois sinónimos surgem de duas vias de leitura disponíveis, embora queiram dizer exactamente a mesma coisa e só haja uma maneira de escrever essa… ahum… coisa! “Shinobi” tem o significado subjacente de “fazer desaparecer” e, por extensão, de “resistir ou aguentar”, enquanto que “mono” quer dizer “uma pessoa”. Portanto a expressão indica alguém capaz de suportar/resistir e desaparecer. A palavra shinobi tem referências em textos desde o século 8 D.C. e a designação shinobi era a mais usual no Japão feudal. Contudo, a cultura do pós Segunda Guerra Mundial tornou o termo ninja mais popular, talvez pela sua facilidade de reprodução nas línguas dos ocidentais.
Existem ainda muitos termos coloquiais para designar ninjas. Por exemplo, monomi que quer dizer “aquele que vê”. É interessante, e aqui podemos talvez ver expresso linguisticamente, o carácter mágico atribuído aos ninjas. No ocidente, o termo "witch" (bruxo/a) vem do termo celta "wicce" que quer dizer "sábio" simbolicamente, mas literalmente traduz-se para "aquele que vê" ou "vidente". O termo nokizaru também foi usado para os designar e quer dizer “macaco de telhado” (saru é o termo típico de macaco em Japonês, mas refere-se a uma espécie autóctone ao Japão e portanto hoje em dia diz-se Nihonzaru [onde Nihon quer dizer japonês.] Podemos ver o bicho na imagem abaixo). Outros termos mais simples surgem como rappa (rufia), kusa (erva) e Iga-mono (pessoa de Iga). Kunoichi, que quer dizer ninja feminino, surge de se pronunciar cada um dos traços que compõem o caracter para mulher (女 = mulher divide-se em く(ku)ノ(no) 一 (ichi) ).


Historicamente, poucos relatos existem sobre ninjas, se descontarmos os contos populares. O historiador Kiyoshi Watatani disse que os ninjas treinam em segredo e fazem tudo para manter as suas artes secretas:
As técnicas do chamado Ninjutsu (…) têm o objectivo que o adversário não saiba da nossa existência, e para elas existem treinos específicos”, Turnbull, Stephen (2007), Warriors of Medieval Japan, Osprey Publishing.
Antes do século XV, os ninjas não eram mais que assassinos a soldo e ladrões. Mas no período Sengoku, durante o qual os samurais de digladiavam em campo aberto e segundo um código de honra, surgiu uma exigência da existência de homens que não se importassem se fazer guerra duma forma tida como menos honrosa. Os ninjas apareceram então como mercenários de excelência, contratados para espiar, assassinar, sabotar ou roubar o inimigo de quem lhe pagasse.
Na guerra, tiveram inúmeros papéis quer como espião (kancho), batedor (teisatsu), guerreiro de emboscada (kishu) e agitador ou criador de caos (konran). Os clãs ninjas organizaram-se em guildas, ocupando cada uma um determinado território. Tinham uma hierarquia: o jonin (o mais alto na hierarquia) representa o grupo e recebe os contratos; os chunin são os seus assistentes e estão no meio da hierarquia; o agente de campo, que recebe e executa as ordens, o final da cadeia hierárquica, tem o título de genin.
Os ninjas surgiram das regiões montanhosas e de difícil acesso em Iga (actual Perfeitura Mie) e Koga (actual Perfeitura Shiga). A inacessibilidade destes locais poderá ter tido um papel fulcral na criação do ninjutsu. É feita a distinção entre os ninjas destas duas províncias e os espiões ou mercenários contratados do povo por samurais, pois estes clãs eram devotos na criação de ninjas profissionais. E foram-no até Oda Nobunaga ter invadido Iga e destruído os clãs organizados. Alguns sobreviventes espalharam-se pelo Japão, mas outros chegaram até Tokugawa Ieyasu que os recebeu bem e os tornou seus guarda-costas pessoais. Entre eles estava o homem cujo o nome foi popularizado no filme Kill Bill: Hatori Hanzo!
Mais tarde, durante o shogunato de Tokugawa Yoshimune, este último criou um grupo especializado na recolha de informação para daymios e membros do governo, uma primeira agência de serviços secretos. O nome da agência era Grupo Oniwaban. Os seus agentes eram chamados de oniwabanshu (jardineiro, no sentido de “aquele que cuida do jardim”). Embora não haja um documento histórico que o diga, a natureza secreta do grupo leva a crer que os seus membros fossem shinobi. Eles são falados, por exemplo, numa das minhas séries de anime preferidas chamada Samurai X.
Esta ligação entre ninjas e agentes secretos leva-me ao meu filme preferido do James Bond: Só se Vive Duas Vezes.
Ora bem, porque é que este é o meu filme preferido do bom e, admitamos, velho 007?
Bem a resposta tem tanto de complexa quando de previsível. Primeiro, é um dos do Sean Connery, que para mim será sempre o melhor dos Bond. Depois, tem uma ameaça de intriga internacional em que paira no ar o terror do romper de uma guerra atómica entre a URSS e os EUA. Em seguida, passa-se no Japão e no Espaço de baixa órbita! Tem os gadjets mais fixes de toda a série, como o cigarro-pistola e a Little Nellie, aeronave que entrou para o Livro de Recordes Guiness como a aeronave mais pequena pilotada. Depois tem ninjas e duas das actrizes japonesas mais giras que já vi até hoje! Aquela mergulhadora de pérolas era adorável! -_- Para além disso, mostra um Bond conhecedor de uma cultura completamente diferente da dele, incluindo até a língua nipónica. Fala-se de coisas como a temperatura correcta para se beber sake! E tem o mauzão do gato, o vilão que sempre curti mais e o big boss da SPECTRUM (tenho saudades desses gajos!). Ainda adorei um ditado japonês usado pelo Bond quando o seu colega japonês goza com o facto de ele ter pêlos no peito (aparentemente os japoneses não os têm). O Bond diz então: "Um velho ditado japonês diz: Um pássaro nunca faz ninho numa árvore sem folhas!" Ahahaha. Brutal!



Pontos menos bons: o Blofeld mostra a cara neste filme e eu acho que a personagem é muito mais interessante quando não lhe vemos a cara; aquela operação para transformar o Sean Connery num asiático foi uma beca puxado, mas no contexto da história deixa-se passar; treinar um ninja em tão pouco tempo é impossível, mesmo para alguém que seja já de início um espião presumivelmente com vastos conhecimentos de auto-defesa.
http://www.imdb.com/title/tt0062512/

Antes de terminar, e como já devem ter percebido, vou só confirmar que este post terá continuação. O assunto é vasto. Falta falar da acção histórica dos ninjas durante a inquietação da era dos Shogunatos, o pouco que se conhece das suas artes marciais e armas, os poderes místicos que lhes foram atribuídos, e também sobre o que é feito deles hoje em dia. Além disso, falarei dum filme chamado Shinobi de origem japonesa que eu gostei bastante, doutro chamado Ninja Academy (ao género da Academia de Polícia), e de um filme de 2009 chamado Ninja Assassin. Justificarei porque acho que o Bond é um ninja-samurai. Essa entrada terá o título Shinobi - Parte 2. Esperemos que a Parte 3 venha a ser a minha curta! Despeço-me por hora, mas prometo o regresso ainda este ano! (e puff!, desapareço numa bola de fumo)
`_´

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