sexta-feira, 14 de junho de 2013

Levanta a Manga e salva 3 vidas



Olá, pessoal.
Parece que hoje é o dia mundial do Dador de Sangue. Eu sou dador de sangue, mas não estou a festejar o dia. E porquê? Porque o governo português, que destruiu um sistema de recolha de sangue quasi perfeito com um mero mover duma burra e burocrática caneta, ainda não teve a honestidade e/ou a maturidade suficientes para assumirem e reverterem o seu erro.
Um governo que é eleito para resolver uma crise, nunca deveria começar o seu mandato destruindo um sistema que está a funcionar em pleno e que tinha custo quase nulo (no que diz respeito à contribuição dos dadores nesse sistema) para a máquina estatal. Como é que o governo o fez? Retirando a isenção dos dadores de sangue às taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Essa medida fez revoltar muitos dos dadores de sangue, na sua grande maioria classe média, classe esse que dois anos volvidos deste governo é virtualmente inexistente neste país. De facto, muitos dos constituintes dessa classe foram forçados a emigrar pelo adensar das condições económicas negativas que este governo alegadamente viria resolver.
Ora, depois de muito barulho ser feito, o governo, sempre lavando a mão de todos os pecados culpabilizando a Troika, insistiu em retirar as isenções, deixando apenas as dos centros de saúde para os dadores. Tal é indicado claramente no site do IPS:
“A legislação em vigor prevê, no artigo 4.º, a isenção do pagamento de taxas moderadoras para os Dadores Benévolos de Sangue, nas prestações em cuidados de saúde primários (Centros de Saúde).”
Meus senhores, o sangue que eu dou serve para transfusões de emergência ou para permitir fazer em segurança operações. Os centros de saúde não oferecem nenhum destes serviços. Ou seja, se eu me vir em apuros e precisar duma operação ou for esfaqueado num assalto e precisar de sangue, terei de pagá-lo mesmo sendo parte dos que fazem com que esse sangue esteja disponível. Não faz sentido. Porquê? Bem:
- o dador de sangue é tipicamente uma pessoa saudável, logo não vai usar e abusar dessa isenção, e é desejável ao SNS mantê-lo em boa forma física para continuar a ter fonte de sangue saudável que tanto necessita para a sua actividade;
- o facto do dador de sangue ter uma isenção, não quer dizer que esteja constantemente no hospital, a tirar a vez a outro nas filas de espera ou a entupir o SNS. Tipicamente são pessoas com consciência social acima da média na sua sociedade e não vão usufruir de algo apenas porque lhes é de borla;
- muitos dadores de sangue deslocam-se até aos hospitais ou outros centros de recolha pelos seus próprios meios (como eu e o meu pai sempre fizemos, ele há muitos mais anos que eu), de 3 em 3 meses (ou 4 em 4, no caso feminino), para fazer a dádiva sem nunca sequer pensar em exigir os gastos de deslocação ao estado;
- a isenção dos dadores é individual e não se estende a familiares ou amigos, como as cunhas dos políticos, id est, só quem contribui tem a isenção;
- uma outra regra, extremamente importante, é que nem todos os dadores têm acesso à isenção. Apenas os dadores assíduos, que dão pelo menos duas vezes por ano (recordo que no caso masculino consegue-se dar 4 vezes e feminino 3 vezes no máximo, por ano, devido aos ciclos de reposição sanguíneos), é que acediam à isenção. Isto porquê? Porque é necessário manter os níveis de sangue no Banco de Sangue. Se uma pessoa der uma vez em 3 anos, porque foi ao parque e estava lá uma carrinha a fazer uma acção de recolha, não deixa de ser dadora, mas não é assídua o suficiente para merecer a isenção.
- a isenção e as regras para a ela aceder existiam exactamente para estimular os dadores de sangue, não só a darem (porque isso ou se tem essa boa fé e consciência ou não se tem), mas sim a darem sistemática e assiduamente até lhes ser impossível por idade ou doença.
É claro que há uma tentativa de que a doação de sangue seja 100% conseguida por dadores voluntários. Mas o que é que se define como doação 100% voluntária? Segundo a definição do Conselho Europeu (clique aqui para ir para a fonte desta citação): “A doação voluntária e não paga de sangue deve significar a doação de sangue ou dos constituintes do sangue por uma pessoa de sua livre e espontânea vontade, sem receber pagamento em dinheiro ou em géneros em troca que possa ser considerado um substituto monetário. Isto inclui também tempo de trabalho que inclua o tempo de doação e deslocação para a doação. Pequenas ofertas, gratuitidades, comes & bebes, devolução de custos directos ou custos de viagem para a doação SÃO COMPATÍVEIS com a doação não paga e voluntária.” Ou seja, nós em Portugal nunca pedimos custos de viagem ou custos directos e muitos de nós perdiam horas de trabalho, que embora pudessem ser justificadas perante o patrão, não eram remuneradas, e nunca soube de estas serem exigidas ou pagas. O cidadão doador sempre assumiu estes pequenos prejuízos em prole de um Estado Social. Logo estávamos mais que dentro da definição da União Europeia como doação voluntária e não paga de sangue. Não só isso, como éramos um exemplo a seguir.
O que é certo é que com estas medidas, tais como elas eram antes do advento deste actual governo, o SNS em Portugal tinha os seus stocks de sangue tão elevados que se dava ao luxo de exportar sangue. Poucos países têm esse luxo, essa auto-suficiência. O Japão, por exemplo, não a tem e é a 3ª economia do planeta. Parece que na Ásia torna-se muito difícil explicar a uma pessoa o que é dar só por dar. Talvez metendo umas medidas parecidas com as nossas, que não enriquecem ninguém monetariamente como no sistema americano, mas que dão um estímulo na forma duma isenção facilite essa compreensão. Os japoneses têm tentado outras formas de atrair mais dadores, como sempre e com grande inteligência utilizando a sua cultura, tornando os locais de recolha em autênticas bibliotecas de manga (a típica banda desenhada japonesa). Para saberem mais, leiam esta notícia do Jornal da Rede Globo. Dou-vos um cheirinho citando o artigo directamente:
"Enquanto aguarda a doação, Roberto escolhe na máquina automática uma bebida, entre dezenas de opções de graça, como café preparado na hora e aproveita para ler um mangá. Quando o aparelho de chamada toca, é hora da doação.
Para passar o tempo durante a doação, a tecnologia ajuda. Todas as cadeiras têm um aparelho de TV comandado por um equipamento sensível ao toque. O doador pode escolher um vídeo e ouvir o som por meio de autofalantes. A doação dura dez minutos, mas - com a diversão - parece ser bem mais rápida. Roberto já está acostumado.
Tóquio já tem cinco bancos de sangue temáticos. Um deles foi inspirado num bar futurista, a decoração brinca com o símbolo da Cruz Vermelha nas paredes e nos bancos."
A menina à esquerda chama-se Nakagawa Shoko e foi a primeira vez que deu sangue. Reparem no livro de Manga ao colo dela.
Por alguma razão estúpida, o blogger não me permite colocar aqui um video do youtube como já fiz milhares de vezes!!! Diz que não o encontra. Acontece de tempos a tempos. Assim sendo, deixo apenas o link para uma "reportagem" de uns camaradas brasileiros que vivem no Japão e demonstram como funciona a recolha de sangue por lá:


E nós, que nunca precisámos de tais medidas adicionais nem tais gastos, desde 2011, que pusemos a nossa auto-suficiência sanguínea em risco. Os vampiros tomaram posse, com as suas ideias neo-liberais [quem nem capitalistas são porque veja-se o caso também nada brilhante dos EUA (o auge do capitalismo na Terra) onde se paga cada dádiva de sangue aos dadores em dinheiro enquanto que a nós até isenções se negam], mas sim autênticos esclavagistas que acham que o Estado quer-se não social mas sim sanguessuga e parasita. Um Estado que lhes serve de rampa de lançamento de carreiras em gestão de topo nas empresas fomentadoras de corrupção, que existe para lhes granjear luvas e subornos na ordem de milhões e negociatas que nos têm deixado todos na penúria, para depois nos acusarem de vivermos acima das nossa possibilidades, enquanto dizem que eles próprios são mal pagos. ‘Tadinhos! Estes actuais governantes e outros de cor (política) diferente mas de índole igual, que andaram (e andam!) anos e anos a literalmente deitar fora plasma proveniente dessa mesma recolha de sangue abundante que se fazia em Portugal, para depois importarem medicamentos feitos a partir de plasma do estrangeiro. E estes actuais, resolveram essa exergia? Não. E ainda anularam a medida que assegurava o contínuo fluir de sangue do povo para o seu (leia-se “do povo”) Estado Social. Parabéns, meus senhores, em serem uma cambada de pseudo tecnocratas destrutivos e para inglês ver. Ah, já me esquecia de mencionar que, também nesta parte dos desperdícios, este governo actual ainda teve de gastar dinheiro em campanhas publicitárias para conseguir manter os níveis de sangue no mínimo que permita coisas simples como, sei lá?, fazer uma operação cirúrgica. E isto quando dar uma isenção quase sempre, não lhes custa puto. Acho que todos concordamos que uma austeridade nos era inevitável, mas esta austeridade cega e fanática que nada resolve e causa problemas onde eles não existiam não nos serve.
Gostava de realçar também que o Estado Social não implica altruísmo. Aliás, eu acho que o altruísmo é outro conto de fadas, muito (ab)usado por políticos para promoverem a sua imagem. Recordam-se do tipo a ir dar sangue de fatinho na scooter? Ah, sim!, o ministro da Solidariedade Social... esse título só por si evoca na minha mente os ministérios do Big Brother de Orwell. O ministério do Amor, que promovia o ódio, o ministério da Paz, que promovia a guerra, etc... Interessante notar que a Scooter já lá vai, substituída por um carro com motorista. Nós damos sangue porque sim sabe-nos bem ajudar os outros, sentimo-nos bem connosco próprios (logo essa sensação já remove o altruísmo, caso no qual faríamos algo sem obtermos nada em troca, nem uma good vibe sobre nós próprios), mas também porque entendemos a necessidade de haver sangue disponível caso nos aconteça algo a nós ou àqueles que amamos. A cooperação solidária é uma consequência da nossa evolução, do nosso desejo de aumentarmos as nossas probabilidades de sobrevivência e de melhorarmos as condições desta última. Logo, se alguém decidir começar a dar sangue exclusivamente para ter a isenção, desde que à partida esteja saudável, por mim está no seu direito e é tão bem-vindo como o dador que a dispensa e mesmo assim sangra por todos nós pelo menos duas vezes por ano. Hoje, que nos aumentam continuamente a carga fiscal com a desculpa de uma dívida contraída por bancos e corruptos e também para "manter o Estado Social", é importante relembrar que o Estado Social e a sua manutenção não implica Escravatura Moderna. Para isso, mais vale termos só o privado e sermos tão bem tratados como somos relativamente a energias, medicamentos, etc, pelo Big Business. Um Estado Social não pode ser desculpa para mais PPP's desastrosas e empresas de trabalho temporário possuídas por membros da assembleia e seu staff. Isso sim, nós não podemos obviamente suportar.
Como já devem saber, perdi o meu emprego precário e voltei a ser N.I.N.J.A., o que me dá, segundo este Admirável Estado Novo, acesso imediato à isenção completa do SNS por falta de rendimentos. O mesmo acontece quando se tem um ordenado num escalão em que não se pague IRS. A ironia desagradável da situação é que onde dantes tinha a isenção porque contribuía a mais que o cidadão comum, agora dão-me a isenção por caridadezinha. É esta inversão de valores que temos de alterar se queremos que o país não reverta ao terceiro mundo. E sim, já estamos no segundo mundo!
Como tal, permaneço dador de medula sempre (e nunca recebi nenhuma isenção ou regalia a mais por isso [nem esperava obtê-la], nem um dador de sangue é de forma alguma obrigado a ser também dador de medula para ter qualquer isenção. De facto tive de ser eu a pedir para me registar, porque nunca me perguntaram se queria ser. Nem tinham de perguntar, pois a ideia é ser voluntário.) e continuo a doar sangue, mas enquanto não for reparado este erro técnico e de valores, dou sangue apenas uma vez por ano (relembro as regras que acima expliquei para se atingir a isenção e acrescento que raros foram os anos em que só dei 2 vezes) em protesto. Só não deixo de dar completamente, porque ao contrário dos nossos governantes eu ainda tenho consciência social, por mim e pelos outros, não deixando que a política que a mim não me enche o papo (antes pelo contrário) me faça perder de vista o que é importante. Escolho dar em Julho e Agosto, porque por experiência sei que são os meses que as pessoas dão menos.
Em Janeiro deste ano de 2013, terá havido um debate sobre a reinstituição da isenção total aos dadores de sangue. Foi categoricamente rejeitada pela maioria da direita:


É dito na notícia acima que teve votos favoráveis de toda a Esquerda na assembleia, por isso a minha esperança nesta luta é quando voltarmos a ter o PS (PSeudo esquerda) no governo (tipo, próximas legislativas, ya?!, como dizem os alfacinhas jove's) este problema seja resolvido.
Amanhã vou à Festa do Japão em Belém. Querem vir?

Sayonara, tomodachi! ;)

P.P.S.: Se chegaram aqui e não perceberam o quão importante é dar sangue e seja preciso eu o realçar, então é porque falhei. Um bom fim de semana!

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