Assim perguntou Gollum a Bilbo, n’”O Hobbit”:
What
has roots as nobody sees,
Is
taller than trees
Up,
up it goes,
And
yet never grows?
A resposta, como deveis saber,
caro leitor, é uma montanha. A montanha que não foi ter com o Maomé, a montanha
que é sinónimo de obstáculo que só pode ser superado com uma jornada repleta de
perigos.
Que tem isso a ver com
octogenários? Bem, no passado mês de Maio, deste ano gregoriano de 2013, um
senhor japonês chamado Yuichiro Miura, tornou-se no primeiro octogenário a atingir
o cume do monte Evereste (que pode ser visto na imagem acima).
Fê-lo com o apoio duma equipa de
peritos montanhistas, na companhia do seu filho, Gota, e sob remota vigilância
da sua filha, Emili, que os acompanhava mentalmente.
Segundo a equipa de apoio de
Miura, centralizada em Tokyo, o pico foi atingido às 9h05min da hora local, na
quinta-feira dia 23 de Maio, tornando Miura o mais velho conquistador do
Evereste. Yuichiro e Gota fizeram um telefonema do topo do Evereste, que gerou
um sorriso e um bater de palmas por parte de Emili, momento captado por uma
equipa da NHK (a emissora pública japonesa). No telefonema, Yuichiro disse:
“Consegui! Nunca imaginei conseguir escalar o Evereste aos 80. Este é a melhor
sensação do mundo, embora eu esteja totalmente exausto. Até nos 80, ainda passo
muito bem.” Numa transmissão de rádio para a estação Kyodo, feita também a
partir do ponto mais alto do mundo, na qual Yuichiro disse: “Chegamos ao topo.
80 anos e 7 meses… A mais incrível equipa de alpinistas do mundo ajudou-me o
caminho todo até cá acima.”
A chegada ao cimo, foi capturada
em vídeo e acompanhada a 10 quilómetros de distância, por uma equipa da agência
Kyodo, com uma câmara colocada numa elevação a 5500 metros do topo.
Contudo, o recorde de Miura é de
vida curta, pois nos seus calcanhares já vinha um escalador nepalês de 81 anos.
Emili, filha de Yuichiro, afirmou que o recorde ao pai pouco importa pois ele
faz o que faz pelo desafio em si e está em competição é consigo próprio. Um
atitude admirável, na minha opinião, que me relembra uma afirmação de
Funakoshi, mestre fundador do Karate Shotokan, que disse e parafraseio: “O
Karate não é acerca da vitória ou da derrota, é sim sobre o aperfeiçoamento do
carácter do praticante.”
Antes de deixar o tópico do
montanhismo, quero apenas recordar que também este ano, pela primeira vez, uma
mulher portuguesa escalou o Evereste. Parabéns, Maria de Conceição, pelo
objectivo cumprido.Eu soube da notícia via jornal Público, onde é dito(clicar nesta frase para ler a notícia toda):
“Maria da Conceição queria ser a primeira mulher portuguesa a escalar o
Everest. E conseguiu. A hospedeira de bordo alcançou o cume da montanha mais
alta do mundo esta terça-feira, às 9h13m locais (4h28m em Portugal). A
iniciativa tinha um objectivo principal: angariar um milhão de dólares (cerca
de 800 mil euros) para a Fundação Maria Cristina, que ajuda famílias
carenciadas no Bangladesh.”
Só para terminar o tópico de montanhismo, gostaria
de recordar que desde 1953 que o Evereste já matou mais de 300 alpinistas, como
avisa e recorda a foto abaixo, tira a 17 de Maio de 2010, quando dois corpos foram recuperados da montanha (fonte).
Quero também aproveitar esta oportunidade para
indicar que o meu avô materno, o último que me resta vivo, fez, neste último 8
de Junho, 89 anos de idade. Ainda está com uma saúde brutal, vai todos os dias
tratar da horta, tem a sua autonomia, come que nem um diabo acabadinho de
escapar do inferno e nunca engorda (infelizmente não herdei essa sua qualidade
genética, ehehe), e não pára de vociferar sobre a sociedade em que vivemos, em
particular a podridão do mundo político. Este meu avô sempre foi uma fonte de
inspiração da minha imaginação, pois ele também adorava contar histórias, na
sua maioria super exageradas, embora algumas também bem contextualizadas na
História que lhe foi (literalmente) reguada cérebro adentro. Hoje em dia, a
minha mãe está-lhe sempre a contestar as estórias sobre a sua ida à Índia e
outras parecidas, e a sua memória já não lhe permite conjugar com a admirável
precisão que antes tinha para um homem que só tinha a antiga 3ª classe
completada e que, como a maioria da sua geração, começou a trabalhar muito
cedo. Por falar em trabalho, trabalhou 55 anos numa só empresa de camionagem,
tendo continuado a trabalhar em biscates e ferro-velho durante muitos anos após
se reformar. Quando no seu apogeu, era o tipo de homem capaz de ir para dentro
dum bosque e construir um centro comercial. Pronto, estou a exagerar... um bocado... vá muito,
mas assim percebem a ideia na boa tradição da minha família! eheh É verdade que ele prometeu a mim, e a todos os meus
primos maternos, que construiria um avião a cada um de nós e eram só babelas,
mas fez carros de rolamentos para os filhos, pranchas de bodyboard feitas em
material compósito e uma rampa de skate enorme para os meus primos. A mim
ofereceu-me uma bicicleta, o meu primeiro computador, ensinou-me a cerrar
lenha, soldar aço (e ainda recentemente o vi a soldar e posso testemunhar que
solda à mão tão bem como certas máquinas industriais), e também ética de
trabalho e liderança, além de estimular a minha imaginação. E ainda
recentemente me espantou, sabendo bem o que é o processo de vulcanização da
borracha, que eu dei numa das cadeiras da universidade. Relembro que ele só (?)
frequentou a universidade da vida, na qual ainda labuta.
Tem uma reforma de 600 e poucos euros, que no geral
em Portugal e na sua geração e extracto social não é nada má, mas compreenda-se
que é a dele somada a uma contribuição da da minha avó materna já falecida. E
tendo em conta que a empresa para quem ele trabalhou entretanto negociou uma
indemnização por vários anos que não lhe fez os devidos aumentos na reforma, de
acordo com regras que eu sinceramente não conheço para delas falar, e
fizeram-lhe as contas nessa indemnização para ele viver até aos 83 anos. Vejam
lá o dinheiro que os sacanas não pouparam já. Interessante notar-se ainda assim
que o “ordenado” dele (como ele lhe chama) nem chega para lhe conseguir
actualmente uma estadia num lar da terceira idade (como indica a notícia
abaixo). Sorte a dele que nos tem a nós e a nossa a sua saúde inquebrantável e orgulhosa
autonomia. É claro que não poderia passar esta oportunidade sem honrar a sua
vida criticando eu também um dos males sociais da actualidade e para este último chamar atenção:
Ele está agora a percorrer a
fronteira entre os 80 e os 90, e eu espero vê-lo a superar a dos 110. O meu avô
sempre disse: “Pede pouco se queres muito.” Mas eu sou orgulhoso e não aprendi
essa lição!
Eu tenho este exemplo na família,
e outros que tais dos meus avós paternos, de pessoas que vivem até idades
avançadas com uma autonomia para lá da norma. Faz-me pensar sobre como estamos
a evoluir em termos de longevidade, o que gera dois problemas imediatos: a
subsistência do Estado Social e o aumento demográfico mundial. Mas o facto é
que também é pelo facto de vivermos até mais tarde que permite uma melhor
passagem de conhecimentos nas sociedades e uma mais rápida evolução. É
interessante vermos dicotomia de uma situação. Todo o bem tem a sua cota parte
de mal. Leva-me também a considerar que a vida e a morte têm uma relação bem
mais complexa que serem a simples antítese uma da outra.
Uma das minhas preferidas curtas-metragens é a do "The Old Man and the Sea", precisamente porque sempre me recordo do espírito guerreiro, inquebrável e indomável do meu avô:
Nota: talvez venha a fazer legendas para ela mais tarde e se o fizer alterarei devidamente esta entrada.
Uma das minhas preferidas curtas-metragens é a do "The Old Man and the Sea", precisamente porque sempre me recordo do espírito guerreiro, inquebrável e indomável do meu avô:
Seja como for, eu considero os
meus avós as raízes nada invisíveis do ramo da minha família que em mim
culmina, só para fazer a ligação ao poema com que abri esta entrada. São, para
mim e apenas porque são os mais velhos que conheci na minha linhagem, o ponto
de partida da minha escalada rumo às estrelas.
Sayonara, tomodachi! ;)
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