Não é
fácil definir o conceito de Energia, mesmo em termos formais da ciência.
Podemos dizer que é uma das componentes existentes quando há interacção entre
dois entes ou sistemas físicos. Podemos ainda dizer que é uma componente
essencial à realização de trabalho. Em termos metafísicos, esotéricos ou
sobrenaturais ainda mais nos perdemos num labirinto de retórica que,
desastradamente, procura parecer sábia mas é vã. Concentremo-nos na ordem
natural das coisas, que é mais que suficiente para este nosso Verso. Queria um
kanji para título deste post, mas a verdade é que, pelo que eu encontrei, o
termo japonês para energia (homólogo deste nosso) é um japonesismo da palavra Enerugï,
que se escreve em kanji:エネルギー. Existem outras duas palavras japonesas que descobri para
energia, mas ambas são específicas: o Ki = 気 (energia espiritual) e o Denki = 電気 (energia eléctrica). Mas até compreendo os japoneses.
Reflectindo sobre o assunto, é um pouco estranho termos uma palavra que sozinha
não tem definição directa. Se falarmos energia mecânica, eléctrica ou cinética
(por exemplo), sabemos instintivamente o que são. Mas se dizemos apenas energia
é um tudo que é nada. E contudo, sabemos que é algo. Como a própria energia, o
conceito em si é algo não palpável. Muitas vezes me sento em frente à minha
lareira a olhar as chamas bruxuleantes no seu interior, como se nelas pudesse
estar a resposta à minha pergunta, o que é o fogo? É sem dúvida um dos
resultados duma combustão. É energia. É luz. É calor. É tudo isso. Mas o que é?
Fogo.
Num
filme, que eu não desgostei, chamado “The Celestine Prophecy”, que eu vi
originalmente porque nele entra o ilustre Joaquim de Almeida, é dito a certa
altura que todas as interacções humanas são resultado de interacções de campos
energéticos gerados pelos seres vivos, os quais nós nem nos apercebemos que
existem. Na mitologia do filme, a tomada de consciência desses campos e a
realização de que não nos devemos procurar dominar uns aos outros (ou, neste
contexto, sugar energia ao próximo), leva a um mais elevado plano espiritual.
Mas isto tudo para chegar ao ponto de que nesse filme é dito que todas as
guerras ou disputas humanas são essencialmente por energia. De facto, acaba
sempre por ser, em última análise. Se na Pré-História guerreávamos por territórios
de caça, era porque necessitávamos dessa caça para fornecer energia aos nossos
corpos. Hoje lutamos por petróleo, por gás natural, por metais radioactivos,
etc… mas essencialmente, lutamos por energia em qualquer que seja a sua forma.
De facto, nós somos energia. Como diria o Yoda: “Seres luminosos somos nós, não
esta rude matéria.” E como adorava Christopher Hitchens relembrar, parafraseando
outro autor: “Esqueçam lá a morte de Cristo, estrelas tiveram de morrer para
nós estarmos aqui hoje. Não é isso mais glorioso que o Arbusto Flamejante?”
Por falar em Mitologias… Na minha
infância, antes de ler romances, policiais e ficção científica, lia Banda
Desenhada. Entre as muitas que lia, como não podia deixar de ser para alguém da
minha geração, estava a das Tartarugas Ninja. Estranhamente, a saga que eu mais
gostei dessa BD, foi uma na qual não entravam os intervenientes do costumo. O
Destruidor (The Shredder), o Krang, o Beebop e o Rocksteady, e o seu exército
de Ninjas Foot, foram trocados por um clã de ninjas tradicional e místico, um
samurai feiticeiro que odeia a Humanidade e uma ninja raposa, lacaia deste
último. Em vez de Casey Jones como aliados, temos um rapaz que se consegue
transformar num dragão gigante. Nova Iorque aparece substituída por Hiroshima.
Mas o que me apaixonou nessas edições que nem vinham seguidas mas de forma
intercalada, eram as introduções. Um mito de criação do Japão (acima), uma cena
contextualizada no dia fatídico da queda das bombas nucleares (abaixo),
dando-nos um vislumbre sobre a vida anterior do Mestre Lascas (Sensei Splinter).
Depois a história essencialmente,
era que o Samurai Feiticeiro queria usar o Dragão Guerreiro, para destruir uma
uzina nuclear, cuja energia iria soltar um Demónio para destruir a Humanidade.
Com uma ajudinha dos Deuses do Yin Yang, os Tartas conseguem furtar tais
planos, que são afinal uma ameaça terrorista hoje em dia tão passível de ser
tornada realidade, mesmo sem a existência de dragões e demónios ou deuses.
Queria apenas partilhar esta parte da minha infância convosco, pois foi um pouco dela e da actualidade, que me surgiu a inspiração para este post e para a imagem a que chamei Mushroom Yin Yang. Mas digresso…
O Japão está, muito como
Portugal, ou mesmo como toda esta nossa Aldeia Global, num momento de mudanças
impostas pela inevitabilidade das consequências das decisões do passado.
Fantasmas de outrora influenciam o momento presente. A Crise, que no grego
antigo quer dizer Momento de Mudança, é diferente para Japão e Portugal, mas
inevitável para ambos. A crise em Portugal foi criada pela ganância desmesurada
dos homens, aliada a uma grande dose de credulidade e ignorância. A crise
japonesa foi criada pelos esbirros de Gaia, se quisermos empregar uma linguagem
mais poética, mas também pelo uso descuidado duma tecnologia que é na melhor das
hipóteses um pau de dois bicos.
O Super Terramoto de 2011 que
atacou o Japão fez com que o Estado Japonês tivesse de confrontar o verdadeiro
perigo de ter Centrais Nucleares numa zona geográfica de alto risco do ponto de
vista da sismologia, como é aquela em que se encontra o seu país. O já
existente movimento verde anti-nuclear ganhou momento com este terrível
acontecimento e o desastre proveniente da destruição da Central Nuclear de
Fukushima.
Onde antes me centrei nas lições
aprendidas (vide os dois links abaixo) em termos de prevenção e preparação para
este tipo de situações (sismos e tsunamis), venho agora nesta nova entrada
abordar em profundidade o controverso tópico do nuclear e a questão energética
que cada vez mais vai apoquentar as sociedades modernas, servindo-lhes também
de travão evolutivo a nível tecnológico. É certo que cada vez nos tornamos mais
dependentes de energia, pois tornámo-nos uma civilização altamente tecnológica.
Contudo, o próximo nível de avanços científicos, hologramas, sabres de luz,
motores iónicos, teletransporte, motores anti-gravidade, tudo depende
essencialmente de quanta energia conseguimos gerar, logo essa quantidade de
energia acaba por ser o nosso limite tecnológico!
Novas, Actualidades e Trabalho de CampoMega Sismo: Quanto o Infinito Encontra o Zero
Ora, dos meus outros posts, nota-se o meu óbvio
interesse nestas áreas. A sismologia porque foi o sismo de Março de 2011 que
comprovou os dados recolhidos pelo astúcia e visão governativa do Marquês de
Pombal em 1755 e que até 2011 se julgavam exageros de uma sociedade retrógrada.
Portanto, no que diz respeito à sismologia, vivemos uma altura interessante em
Portugal, embora acho que no meio de tanta coisa em que pensar com a Crise e a
Austeridade, isto passou completamente ao lado do povo. Supostamente, no último
trimestre de 2013, vai entrar em funcionamento um sistema de alerta de Tsunami
em Portugal. Se forem ao post que escrevia (acima “linkado”) intitulado “Mega
Sismo: Quando o Infinito Encontra o Zero”, poderão perceber que muitas vidas
podem ser salvas pela implementação de um tal sistema.
Vejamos se o sistema é
implementado e se fica a funcionar em pleno, incluindo apps de telemóvel para
que os cidadãos possam ser avisados no momento, tal como existe no Japão, hoje
em dia.
Outra coisa que mais cedo ou mais
tarde terá de nos preocupar é a preparação de edifícios antigos para um
terramoto.
http://www.publico.pt/mundo/noticia/intervencao-antisismo-em-edificios-antigos-nao-e-tao-comum-como-isso-1493840
Com o estado actual da construção pública em
Portugal e a falta de emprego, seria uma lufada de ar fresco para muitos, se o Governo cagar
para os bancos, if you pardon my French, fechando-lhes as torneiras e antes
investir nessas obras de interesse público, particularmente em zonas de muito
risco, como o Algarve e a Baixa Lisboeta. Erguer muralhas defensivas também não
fazia mal nenhum. Mas eu sei… eu sei… não há dinheiro (no futuro post na
rubrica “Os Meus Versículos Satânicos”, para o qual ainda me digladio com um
subtítulo, hei-de oferecer ideias e alternativas para superarmos a nossa
Crise). Mas imaginem no que esse investimento poupará quando vier o tsunami e o
sismo. Eles hão-de vir, descansem. Mas são como a Morte, inesperada e
impiedosa! Mas não se iludam, pois é certo que a Construção (movida a capitais estatais), embora faça surgir emprego momentaneamente podendo aliviar o sofrimento e a fome (não poupemos palavras) de alguns, em termos de resolver crises económicas não é solução, uma vez que é um investimento que não é exportável, logo não aumenta a nossa produtividade, mas sim a despesa de estado e a dívida. Quero com isto dizer que só espero que as probabilidades estejam connosco e que o Tsunami só retorno a terras lusas muito após termos superado os nossos problemas socio-económicos.
Voltando à questão energética, Portugal
nunca aderiu à tecnologia nuclear e com efeito um dos vários problemas que
contribuem para a nossa falta de auto-suficiência nacional e, consequentemente,
para a nossa actual crise económica, é a incapacidade de gerar internamente
energia suficiente para as necessidades de todo o país, sendo portanto forçados
a importá-la. Duma forma ou de outra, uma vez que importamos energia da Espanha
e da França, também nós dependemos do nuclear. Por outro lado, somos um dos
países da União Europeia que mais energia verde produz, através de barragens, painéis
solares, geradores eólicos e de energia de ondas marítimas. Hey, não podíamos
fechar a tabela em tudo. Contudo, essa energia representa cerca de 30% da
energia total que precisamos actualmente no país. E é preciso reparar que
actualmente Portugal tem muito pouca indústria, logo no futuro, se conseguirmos
escapar à mediocridade da nossa classe política governante e realmente
semearmos as bases para uma retoma económica em larga escala no país,
emergiremos a necessitar de ainda mais energia. Just some food for thought…
Já o Japão tem uma longa e estranha, para não dizer infeliz, história com
a tecnologia nuclear. Já antes abordei o tópico do único ataque nuclear alguma
vez levado a cabo na História escrita da Humanidade, com as bombas de Nagasaki
e Hiroshima, e todo o horror que daí surgiu, bem como certos traços subculturais,
nos posts abaixo “linkados”:
Mas e o que aconteceu ao Japão
depois desse trágico final da Segunda Guerra Mundial?
Bem, menos de uma década após
o final dessa Guerra, em Agosto de 1945, o Japão já estava a executar planos
para poder gerar energia eléctrica através de uma central nuclear, para
satisfazer as suas crescentes necessidades eléctricas. Uma campanha de
propaganda muito inteligente, que usou a combinação do desejo dos japoneses por
uma vida melhor e o medo de perder esse futuro brilhante devido a falta de
electricidade, fez com que a opinião pública esquecesse ou pusesse de parte o
terror das bombas nucleares. O Japão, localizado numa das zonas mais instáveis
a nível sísmico do planeta, tornou-se na plenitude dos tempos numa país com 50
centrais nucleares e o terceiro maior produtor eléctrico a nível mundial.
Ora, se eu fosse Jung falaria do Sincronismo necessário para que tal se tenha
passado.
A estrada para o Japão nuclear
que conhecemos é uma de esforços secretos durante a guerra por parte de
cientistas nucleares japoneses, de um nacionalista de direita que dominou a
política japonesa durante quase 50 anos, de um magnata dos media que trabalhava
com a CIA, de um espalhafatoso piloto com jeito para a auto-promoção, do mais
popular e corrupto primeiro-ministro japonês pós-guerra, e dum colectivo de
orgulho desmesurado que ficaria conhecido como a aldeia de energia eléctrica.
Em 1945, a bordo do USS
Missouri na Baía de Tóquio, foi assinado o acordo que deu por terminada a
guerra, passando o controlo do Japão para a Ocupação Norte-Americana, que
procurou refazer o Japão à imagem dos E.U.A., ou o mais próximo disso possível,
no intuito de impedir uma nova guerra catastrófica. Os gestores americanos que
foram para o Japão administrar a Ocupação, da escola do New Deal de
Franklin Roosevelt, vinham cheios de optimismo e de uma ingenuidade
popularizada anos mais tarde por Graham Greene, no romance “The Quiet
American” (que hoje em dia já conta com pelo menos uma adaptação
cinematográfica). Ainda assim, de boas intenções está o inferno cheio, e foram
essas alegadas boas intenções que chegaram aos jornais e revistas
norte-americanos, enquanto que a verdadeira história da Ocupação é uma bem mais
sórdida e que permaneceu durante muitos anos secreta. Esta, trazida à luz do
dia, destrói a cuidadosamente guionizada versão oficial da transição pacífica
do Japão para uma nação democrática.
Nenhum segredo terá dado mais
causa de reflexão à América que o facto do programa atómico japonês durante a
guerra estar bem mais avançado que alguém pudesse conceber em Whashington D.C.
Apenas semanas após a rendição é que foi descoberto que cientistas japoneses em
Tóquio, Quioto, e na Coreia ocupada pelo Japão, tinham estado a trabalhar para
chegar à Bomba. À medida que os anos ‘40 deram lugar aos anos ‘50, e a Guerra
Fria começou, muitos dos japoneses presos como criminosos de guerra, deram por
si a serem libertados, para se tornarem em aliados de Whashington contra o Comunismo.
A necessidade de os EUA de terem um aliado no Oriente contra a então já nuclear
União Soviética e uma China Comunista, intersectou o antigo sonho do Japão para
ter uma fonte de energia segura, limpa e estável. O momento da energia nuclear
no Japão havia chegado.
Em 1953, com a guerra da
Coreia a terminar numas tréguas instáveis, Yasuhiro Nakasone, um nacionalista
japonês em ascensão, foi convidado a estudar na universidade de Harvard. Ao
frequentar essa universidade, conheceu um ambicioso académico de Harvard: Henry
Kissinger.
Quero só acrescentar antes de
prosseguir que Kissinger nunca se atreveu a processar Hitchens pelo livro que o
acusa de ser um mentiroso, um criminoso de guerra, presumidamente porque para
isso teria de o enfrentar em tribunal. Aliás, o Hitchens ainda o processou ou
tal ameaçou via advogados por todos os insultos que Kissinger lhe fez. Mas os
advogados de Kissinger acabaram por emitir um comunicado em que pediam desculpa
a Christopher Hitchens pelos insultos prestados. Kissinger é vil, mais que
maquiavélico, um doido por poder em toda a acepção da expressão. Infelizmente
este livro não se encontra traduzido para Português e eu também não disponho do
tempo para traduzir os vídeos ou o resumo. Contudo, deixo-vos 6 pequenos
vídeos, retirados de outros mais longos vídeos de palestras e entrevistas do Hitch
sobre a sua batalha com Kissinger, só para terem uma breve noção do que esta
foi. Estes foram traduzidos por mim. De seguida continuo a explanação
histórica.
Kissinger contou ao jovem
Nakasone, que viria a tornar-se primeiro-ministro três décadas mais tarde, um
segredo. Muito em breve, os EUA iriam partilhar o seu conhecimento nuclear com
países interessados não em fazer bombas, mas sim em criar centrais nucleares. Em
Dezembro de 1953, o presidente Eisenhower anunciou a sua iniciativa “Átomos
pela Paz”. Nakasone tinha já avisado os seus amigos no Japão, incluindo
cientistas do antigo programa nuclear japonês, que muito em breve teriam acesso
a tecnologia nuclear norte-americana para construir reactores nucleares. Mas
havia um obstáculo. A população japonesa ainda não esquecera que “nuclear”
queria dizer, antes de mais nada, a devastação de Hiroshima e Nagasaki. O que
Nakasone e companhia precisavam então era de uma mente que pensasse como eles
nos Media, que trabalhasse afincadamente para veicular a mensagem deles. Eis
que surge Matsutaro Shoriki. Aprisionado como um criminoso de guerra classe A
mas libertado antes de ser julgado, Shoriki era uma figura imponente que
dirigia o jornal Yomiuri Shimbun
(que com a circulação reportada de 10 milhões de cópias por dia, afirma ser
o maior jornal do mundo). Por 1954, as suas raivosas visões anti-comunistas
eram projectadas não só no Yomiuri como na Nippon TV, uma das primeiras
estações televisivas japonesas, que ele também dirigia. Como o jornalista
freelancer Tetsuo Arima detalha no seu livro “Genpatsu, Shoriki, CIA”
(Energia Nuclear, Shoriki, CIA), Shoriki era também um amigo da CIA e um
ardente defensor do nuclear. Com a ajuda de Nakasone, Shoriki usou o seu jornal
como um organismo virtual de relações públicas para a energia nuclear. A
manchete do Yomiuri no dia de Ano Novo de 1954 era “Finalmente o Sol foi
Capturado”. Era o primeiro de muitos artigos a argumentar o abraçar desta
nova forma de energia e o começo de uma longa e entusiástica campanha daquele
jornal que, de uma forma menos berrante, continua até aos dias de hoje.
Contudo, mesmo quando este
pequeno mas influente lobby composto por Nakasone e Shoriki, com o seu
altifalante Yomiuri, começava a ganhar momento, a tragédia atacou. A 1 de Março
de 1954, 23 pescadores japoneses, a bordo do seu barco o Daigo Fukuryu Maru (tradução:
Dragão Sortudo Cinco), foram expostos a precipitação ou poeiras radioactivas
provenientes duma explosão nuclear levada a cabo pelos americanos no Atol
Bikini. Ainda assim, dias depois e embrulhado em segredo, o parlamento do Japão
(sob orientação de Nakasone) aprovou o primeiro orçamento destinado à pesquisa
nuclear, um orçamento de 235 milhões de yen. O primeiro passo para as centrais
nucleares fora tomado.
Sem se deixar demover pela
preocupação do público sobre o caso do Daigo Fukuryu Maru, O jornal Yomiuri
continuou a sua campanha de propaganda. Shoriki ajudou a patrocinar uma
exibição em Tóquio no ano de 1955, que apresentava as maravilhas do poder
nuclear, e, por esta altura, uma das personalidade mais mediáticas do Japão
juntou-se ao lado Pró-Nuclear.
Zensaku Azuma era conhecido
pelo público japonês como um espalhafatoso piloto que voo sozinho sobre a
Europa, os Estados Unidos e a Ásia em 1930. Em meados dos anos ‘50, ele era uma
bem conhecida celebridade que se sentia intrigada pela energia nuclear. Em
1955, ele encontrou depósitos de Urânio na fronteira entre as prefeituras de
Okinawa e Tottori. Ele andou em digressão pelo Japão a comer comida carregada
de Urânio antes de morrer de cancro 10 anos depois, aos 74. (provavelmente,
se não fosse parvo teria chegado aos 100 :). Contudo, após a descoberta de
que o Japão tinha depósitos nacionais de Urânio, o país ganhou uma febre por
Urânio. As pessoas compravam contadores Geiger e escavavam os quintais em busca
do minério. Quintas anunciavam que vegetais nascidos em campos que tivessem
traços de urânio eram melhores para a saúde. Uma mulher da prefeitura de Gifu,
vendia vinho de arroz japonês com traços de urânio. Mas como todas as modas,
esta depressa acabou por esmorecer e desaparecer (para bem dos japoneses e
da sua saúde diria eu).
Contudo, pela altura em que a
maluqueira pelo urânio desapareceu, Shoriki já tinha sido nomeado, em 1956,
para a primeira Comissão Japonesa de Energia Atómica, independentemente de ele
não ter quaisquer conhecimentos de física nuclear (hein?, é igual em todo o
mundo… a merda rola monte a cima na puta da política!). De qualquer forma, a
aceitação pelo público japonês da energia atómica enquanto fonte energética
pacífica estava a espalhar-se. Contudo, o governo tinha outros obstáculos à
construção das centrais nucleares, um dos quais podia levar o país à
bancarrota!
Em 1960, o Fórum Industrial
Atómico Japonês, um lobby industrial, foi secretamente comissionado pela
Agência da Ciência e Tecnologia para desenvolver uma estimativa do custo,
baseada numa pergunta a qual não se queria dar a conhecer ao público: “Quanto
teria a administração japonesa de pagar em compensações face a queixas
derivadas a acidentes nucleares?” (eu não vos digo? Merda é merda em todo o
lado, só eventualmente muda a cor. E antes que me chamem racista, refiro-me a
cores político partidárias, ok? ) O Fórum apresentou uma série de cenários
possíveis, mas no pior dos casos o governo teria de pagar 3.7 triliões de yen
em compensações. Isto numa altura em que o orçamento nacional japonês era de
1.7 triliões de yen!
O governo escondeu o relatório
durante 40 anos, até este vir à luz em 1999 (Estranhamente, este foi o ano
em que estreou o The Matrix. Espero não precisar de explicar a
gigantesca metáfora sócio-política que esse filme é). Mas o Fórum foi
claramente a razão que levou o governo passar em 1960, o decreto-lei sobre
Compensação para Danos Nucleares, que isentava os operadores de centrais nucleares
do pagamento de compensações “no caso do dano ser causado por uma catástrofe
natural de carácter excepcional”. Com isso, um dos últimos obstáculos à
construção de centrais nucleares havia sido superado. Esta lei viria a
permanecer mera teoria até o desastre de Fukushima em Março de 2011 forçar o
governo e o público a tomar consciência das suas reais ramificações.
O primeiro reactor nuclear
japonês foi construído perto de Tóquio em 1961 e entrou em operação apenas 5
anos mais tarde em 1966. Mas a verdadeira alvorada da era nuclear no Japão,
surgiria a 14 de Março de 1970, na abertura da Expo de Osaka. Nesse dia, os
visitantes eram recebidos com sinais que proclamavam orgulhosamente que a
central Nª1 de Tsugura, na perfeitura de Fukui estava a auxiliar a fornecer
energia para a Expo.
A Expo de Osaka tomou lugar
mesmo quando as questões ambientais estavam a ganhar proeminência. Respondendo
aos horrores de envenenamento por mercúrio em Minamata e a tenebrosa realidade
da poluição do ar derivada do boom económico (como tem vindo recentemente a
acontecer no Brasil, na China e na Índia) dos anos ‘60, combinado com a
crescente tomada de consciência de que a energia nuclear nasceu das armas
nucleares, nasceu um movimento político Anti-nuclear poderoso e vocalizado. Ao
mesmo tempo, a política do Governo era construir centrais nucleares próximas de
pequenas vilas, que tinham o direito democrático de as rejeitar se assim
quisessem. Para o governo, tornou-se uma alta prioridade garantir que tal não
acontecesse, especialmente depois de o processo legal movido em Ikata
(prefeitura de Ehime) contra uma proposta central ter dado o tiro de aviso. Mas
o que fazer? Felizmente para o lobby pró-nuclear o primeiro-ministro da altura
tinha um plano.
Kahuei Tanaka elevou-se de
origens humildes na longínqua prefeitura de Niigata, na zona costeira do Japão,
para se tornar no mais popular e controverso primeiro-ministro Japonês. Nos
anos 1970, ele governou o país como poucos fizeram desde essa altura,
primariamente porque assegurou que as províncias japonesas, extremamente
subdesenvolvidas, receberam pelo menos alguma parte da riqueza nacional.
Reconhecendo que o que
muitas das vilas piscatórias da costa japonesa precisavam, e queriam, eram
projectos de obras públicas, Tanaka fez aprovar 3 leis em 1974 garantindo
fundos de Tóquio aos governos locais caso estes concordassem em hospedar uma
centrar nuclear na sua zona. Durante as décadas que se seguiram, as prefeituras
de Ishikawa, Fukui, Shimane, e, claro está, a própria terra de Tanaka, Niigata,
entre outras, abriram as portas a centrais nucleares em troca de dinheiro para
construir estradas, pontes, centros comunitários, estações de comboio, e
sistemas de esgotos modernos. E assim que a central nuclear estava construída,
havia mais dinheiro a ser ganho localmente, trabalhando partime na central
nuclear durante os períodos de inspecção, ou a providenciar comida, abrigo e
transporte às hordas visitantes de técnicos especializados e agentes
governamentais.
Contudo, nem toda a gente estava
convencida de que o nuclear era a solução. Em 1975, o Centro de Informação
Nuclear dos Cidadãos foi fundado pelo professor de Química Jinzaburo Takagi,
como uma forma para educar o povo sobe aquele tópico. Ambos o acidente de Three
Mile Island(1979) e de Chernobyl (1986) fizeram com que subitamente um grande
número de japoneses compreendesse que a energia nuclear não era assim tão
segura como lhes havia sido publicitado.
Isto levou ao rebentar de um
esforço por parte dos cidadãos para afastar o Japão do caminho do nuclear. Em
1988, reuniram 3.6 milhões de assinaturas que apoiava uma nova lei para fechar
todas as centrais nucleares. Mas o governo Japonês, sobretudo Yasuhiro
Nakasone, ignorou a campanha, tal como fez o partido do governo de então, o
Partido Liberal Democrático(Lá liberal até pode ser, deu-se à liberdade de
os ignorar, já democrático… eh! Afinal, não houve um único fascista que não se
dissesse amante da liberdade. “Palavras são vento”, diz-nos George R R Martin).
Entretanto, foi dito ao povo que havia poucas opções (a história é
sempre a mesma). As energias renováveis diziam-se ser ainda demasiado
dispendiosas e de pouca confiança (um argumento ainda usado nos dias de hoje
pelo lobby pró nuclear), enquanto medos de outra crise de petróleo como a de
1973 permitiu que o lobby pró nuclear argumentasse contra uma mudança de
energia nuclear para energia baseada no petróleo, dizendo ser uma má ideia (realmente,
venha o diabo e escolha. Se bem que a do petróleo acaba por ser menos
problemática em termos de segurança).
Outros esforços para libertar
o Japão do Poder Nuclear, foram desenvolvidos ao longo dos anos ’90. Por
essa altura, décadas de energia nuclear haviam criado um vício a essa forma de
energia nas cidades que consumiam electricidade por ela providenciada (a custos
baixos, era dito ao povo), e também nas vilas, onde as centrais nucleares se
haviam tornado nas galinhas dos ovos de ouro locais e lhes providenciavam as
mesmas, se não melhores, infra-estruturas e transportes que os dos primos das cidades.
Sinais de perigo, tais como
uma fuga de sódio em 1995, um fogo no reactor de plutónio no monte Monju, foram
ignorados, tal como o foi um acidente na central de Tokai-mura, perto de
Tóquio, em 1999, que matou 2 trabalhadores e expôs medidas de segurança
defeituosas. Seguiram-se outros incidentes: em Agosto de 2004, a tragédia
surgiu quando uma tubagem de vapor corroída, que nunca fora inspeccionada em 28
anos de utilização, explodiu matando quatro trabalhadores; no início de 2007,
foi revelado que a Companhia de Energia Eléctrica de Tóquio (TEPCO, sigla em
inglês) falsificara dados de segurança nas suas centrais nucleares em cerca de
200 inconformidades. Nesse verão, a central Kashiwazaki-Kariwa, em Niigata, da
TEPCO foi danificada após um terramoto de magnitude 6.6, com epicentro a 19
quilómetros de distância. Não houve fatalidades, mas a TEPCO admitiu que 3 dos
7 reactores abanaram a ritmos muito acima dos valores especificados em
projecto.
Ainda assim, a TEPCO e a
aldeia nuclear negaram a possibilidade de um incidente de grande porte. Ao
invés, concluíram que o terramoto de 2007 provara que as centrais eléctricas
japonesas eram de facto à prova de sismo e de que a tecnologia japonesa de
energia nuclear e a sua gestão era a melhor do mundo.
A História, estavam eles
confiantes, havia comprovado que a decisão tomado nos anos ’50, para abraçar a
energia nuclear fora a correcta, para uma nação pobre em combustíveis fosseis
como o Japão. A TEPCO afirmou, após o susto trémulo de 2007, que eventualmente
as centrais de Kashiwazaki-Kariwa iriam ser tornadas ainda mais seguras face a
tremores de terra. Assim como também aconteceria com 4 reactores que operavam
numa prefeitura chamada Fukushima. Mas entretanto, a aldeia nuclear do Japão
assegurava com confiança a nação e o Mundo de que nada havia com que se
preocupar.
Coloquei esta perspectiva
histórica em itálico pois foi praticamente toda traduzida de um documento, cujo
pdf debate a questão do nuclear no Japão:
Fresh Currents
Quanto a Fukushima, quando vi o
documentário Children of the Tsunami, que muito me impressionou, tanto pela
positiva como pela negativa (e sobre o qual é provável que venha a fazer uma
crítica alongada e análise aprofundada num futuro post), onde as crianças
viviam em zonas radioactivas, em que os pais estão constantemente a medir os
níveis de radiação para as deixar brincar na rua, fiquei de imediato com a
impressão de que nada de bom ia sair daquilo. O próprio governo parece estar a
usá-las como os proverbiais ou históricos “canários na mina de cobre”. Posso
estar a ser injusto, mas foi a impressão com que fiquei e então permaneci
atento às notícias. Eis as manchetes (links) que vieram a confirmar o meu medo:
Ora, a evolução genética da
Borboleta há-de ser mais rápida que a do homem, são criaturas efémeras, vidas
inteiras em apenas 24 horas nalgumas espécies, logo é normal que evoluam de acordo
com o seu ambiente mais rapidamente, daí já estarem a mutar. Uma criança humana
poderá demorar muito tempo até demonstrar problemas ou deformações geradas pela
radioactividade a que é exposta. Pode até só saber de que há algum problema,
quando o seu primeiro filho nascer com alguma deficiência genética ou quando
descobrir que afinal é estéril pela radiação ter deformado o seu aparelho
reprodutivo. Por isso, é de loucos deixar aquele pessoal continuar a viver
naquela zona, pelo menos até a descontaminarem minimamente, o que pode levar
muitos anos.
Agora, retornando à questão
energética. A catástrofe social, não menor que a natural que a causou, que se
abateu sobre Fukushima, empurrou uma bola de neve de médio tamanho pela
montanha abaixo e criou uma avalanche de sentimento anti-nuclear.
Ora,
que tenho eu a dizer sobre isto?
Bem,
primeiro sejamos historicamente justos. Embora deteste como a energia nuclear
foi “vendida” ao povo japonês, mediante propaganda e lobbies, não posso ter a
certeza, mas duvido com grande convicção de que o Japão se tivesse tornado na
quarta economia mundial hoje em dia sem ter tido a sua era atómica como teve. A
independência energética é essencial para gerar um país tecnologicamente
avançado e rico.
Dito
isto, eu nunca fui defensor das centrais nucleares. Para além de criarem lixos
radioactivos, dos quais muitos barris acabam no fundo dos nossos oceanos ou em
aterros secretos e nada seguros, que podem ser geradores de toda uma quantidade
de problemas no nosso futuro enquanto Humanidade, considero-as demasiado perigosas
no presente. É claro que o risco pode ser diminuído consideravelmente através
de correctas medidas de segurança, da contínua execução de vistorias e
fiscalizações sérias e independentes, de uma contínua actualização da
tecnologia de segurança utilizada, e particularmente dos locais onde são
construídas. Ora, o caso geográfico do Japão é terrivelmente mau para albergar
centrais nucleares, como de resto já se pôde ver, graças ao terramoto.
Tendo em conta o quanto o nuclear caiu em desfavor na opinião pública
japonesa, ou o quanto parecem a sociedade e mesmo algum do tecido empresarial
japonês estarem ansiosos por uma evolução para as energias renováveis e limpas,
eu diria que a melhor opção para o Japão é começar uma substituição gradual das
suas fontes energéticas. E óbvio que não pode ser drástico, pois há que garantir a economia japonesa, bem como as necessidades energéticas do povo japonês. Mas podem ir substituindo gradualmente as centrais mais antigas e/ou em zonas de maior risco sísmico.
Estranhamente, Portugal e Japão, mais uma vez poderiam
ajudar-se mutuamente. Portugal precisa drasticamente de aumentar a sua
produtividade. Nada tem a ver com trabalharmos mais, não somos mandriões como os idiotas dos nossos
governantes (e não a Troika) parecem pelas suas atitudes achar, mas sim em conseguirmos produzir
bem valiosos para os mercados externos que façam entrar investimento e lucros
no país mediante exportações. Ora, nós somos o país europeu com mais produção
energética via energias renováveis, temos projectos e/ou parcerias pioneiras de sistemas que
aproveitam as ondas do mar (algo que o Japão também tem em abundância) e também
em geradores eólicos.
Seria óptimo para os nossos estaleiros e mesmo para novas
empresas que desse novo nicho de mercado surgissem, que conseguíssemos ajudar os
nossos amigos de há muito no seu processo de adaptação energética, ao mesmo
tempo que nos tornávamos mais produtivos. Este seria um excelente sentido a dar
à nossa política externa e política de economia interna, sendo que talvez pudéssemos também servir de
mediadores na rixa das ilhas Senkaku, dadas as nossas amizades tanto com o
Japão como com a China. Uma guerra daí proveniente não favorece nada nem Portugal
nem o Mundo. Ainda assim, creio estar a sonhar alto, considerando o actual Ministro de Negócios Estrangeiros português.
Mas disso (das ilhas Senkaku) falarei no próximo post, pois como sempre já me
alonguei demasiado por hora...
Sayonara,
tomodachi! ;)
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